[Análise] Rogue One: Uma História de Star Wars

Analisar Rogue One: Uma História de Star Wars não é tarefa simples. Gostar ou não gostar é pouco. Seria mais fácil tentar puxar as orelhas de um gundark do que separar o profissional do pessoal, o fanboy do avaliador, o choro das torcidas de nariz, enfim, tudo aquilo sentido durante uma projeção desse calibre. Entretanto, o esforço é válido quando o primeiro longa-metragem não integrante de uma trilogia para o cinema (só para evitar que alguém venha falar que esqueci do Especial de Natal) do universo criado por George Lucas joga um caminhão-tanque de gasolina na já energizada – e ensandecida – base de fãs da Santa Trilogia.

Separar é preciso. Olhar todos os aspectos é uma obrigação. E curtir o momento é um privilégio. Então, vamos nessa e que a Força dos Outros Esteja Sempre Conosco!

(contém spoilers leves, depois piora! já viu o filme? é melhor!)

[Prefere OUVIR este artigo? Então clique no player absixo, baixe o áudio e escute no carro, na academia, na rua, no chuveiro (mas use uma caixa de som, não um headphone, tá? afinal, não queremos ninguém tomando choque!) A versão em áudio desta, e de outras matérias aqui no site, é resultado de uma parceria entre Fábio M. Barreto e
Paulo Carvalho, do Caixa de Histórias. Este é o primeiro teste, logo, sua opinião é fundamental para colocarmos tudo nos eixos. 🙂 ]

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PARTE I: A Força dos Outros

[O especialista devoto da Saga há anos toma o púlpito, arruma o cabelo bagunçado – que continua bagunçado mesmo assim – limpa a garganta, dá um sorriso largo e começa a falar]

Nos meados de 1977, quando os letreiros iniciais do então Guerra nas Estrelas desapareceram no infinito e abriram espaço para a fuga desesperada da Tantive IV, o universo nerd foi jogado sem aviso no meio de um conflito galáctico, numa guerra civil, na luta do oprimido contra o opressor. Ao mesmo tempo, dezenas de perguntas ficaram sem respostas nas telas e, embora o Universo Expandido (agora renomeado como Legends) tenha feito o possível para preencher as lacunas, a abrangência das respostas ainda era muito pequena por estar confinada a histórias em quadrinhos, jogos de vídeo game e computador, e livros… muitos livros. Com a aposentadoria do UE e o reinício, agora com aparente propósito e reorganização focada, de tudo que acontece fora das telas, as equipes envolvidas com os próximos longas-metragens do universo da Santa Trilogia começam a responder a muitas dessas perguntas, oficial e irrefutavelmente. Afinal, se está na tela, é oficial – mesmo que conflitos narrativos ainda existam.

O início de Rogue One aposta naquela declaração de valores – e premissas – claras dentro do universo da saga. Império, resistência, opressão, fé, luta, sacrifício, rebelião. E trata-se da essência rebelde, não do movimento em si. Rebela-se quem tem muito a perder e, ao mesmo tempo, está disposto a perder tudo na luta. Como entramos na história num ponto acelerado, perdiam-se as razões e os sacrifícios que culminam com a destruição da primeira Estrela da Morte. A Trilogia Infame tentou criar essa sensação, mas o foco nos Jedi, nos poderosos e no militarismo ofuscaram e alienaram as pessoas normais envolvidas na luta. E é aí que Rogue One entra, pois o espectador é logo inserido num mundo vivo, duro e no qual ninguém está a salvo, especialmente quando seu destino não está diretamente ligado à família Skywalker.

Esse conceito é reforçado quando visitamos Jedha (Jedha… Jedi), a locação mais relevante dentre os apresentados nesse novo capítulo. Por estarmos no momento do auge do Império, e pós-expurgo dos Jedi, o planeta de origem da ordem era um dos últimos resquícios do que eles representaram, assim como aqueles que nela acreditavam. O cenário é perfeito para corrigir um dos erros mais imperdoáveis de George Lucas, a desmistificação da Força. Enquanto em O Despertar da Força os Jedi são um mito, em Rogue One, eles são sinônimo de fé, do desejo de fazer parte de algo maior, algo que está por todos os lados sem precisar manejar um sabre de luz, mover coisas com a mente ou influenciar soldados cabeça oca. Por esse aspecto, a dobradinha oriental Donnie Yen e Wen Jiang, respectivamente, Chirrut Imwe – o fiel – e Baze Malbus – o cético – é essencial para toda a história, pois conversa com o ponto de vista de Han Solo em EP IV, justifica a magia de Yoda em EP V e, lá na frente, valoriza demais a descoberta de Rey, em O Despertar da Força.

Qual a importância disso tudo? Bem, a esperança é um dos maiores pilares da fé (seja em deuses ou pessoas). E, de fato, um termo permeia Rogue One, é a esperança. Até então, Star Wars abordava jornadas, profecias, escolhidos, pessoas especiais forçadas a enfrentarem seus destinos por vezes pré-determinados, agora vemos um bando de rebeldes agindo – errando mais do que acertando, diga-se de passagem – por conta de um vestígio distante e quase apagado de esperança. Muitos buscam redenção, outros procuram seus lugares numa galáxia cada vez mais radicalizada, alguns só querem uma família – mesmo que agregada. E cada missão, decisão certa ou errada, serve como mais um passo em direção a esse sonho distante.

E esse é o verdadeiro significado do título do primeiro filme da Saga. Uma Nova Esperança. Por anos, Luke Skywalker carregou sozinho a responsabilidade do título, pois ele era a única esperança de paz, sempre diminuindo todos os personagens secundários. Agora não mais. Agora, o espírito da rebelião manifesto nos personagens de Rogue One dá um chega para lá no fazendeiro de Tatooine e deixa claro: “Estamos aqui! Você é bom, mas nunca vai ganhar sem a gente!”. Mas a conexão não para por aí, pois, embora seja considerado um filme antes de Episódio IV, na prática e narrativamente, Rogue One não é um filme solo. Embora existam momentos de ousadia dignos de muito respeito no roteiro de Rogue One, o mais notável é a escolha do momento no qual a história termina: minutos antes do início de Uma Nova Esperança, com Vader perseguindo a Tantive IV até a órbita de Tatooine. Ou seja, Rogue One faz parte de Uma Nova Esperança e, agora, Uma Nova Esperança faz parte de Rogue One. A Santa Trilogia acabou de sofrer transformações fundamentais e as repercussões são imensas. Ela continua como trilogia, mas agora com uma dobradinha no começo? Passa a ser uma quadrilogia? A ausência do opening crawl significa que vai vir mais alguma coisa antes para aprofundar ainda mais a história? Mas não dá para negar, Rogue One é a maior revolução dentro do universo de Star Wars até hoje, pois não para por aí (há mudanças políticas também, leia mais abaixo).

Rogue One (título que, por si, remete à criação do Esquadrão Rogue, comandado por Luke Skywalker em O Império Contra-Ataca e, depois, transformado em série de quadrinhos e livros, sob o comando de Wedge Antilles; e também ao fato de ser o primeiro “filme renegado” dentro do universo) também é um peça imensa na construção do novo Universo Expandido de Star Wars, pois além da nova redefinição para a Força, ele oferece uma ponte entre Legends e as novas histórias ao revisitar a gênese de tudo: os primeiros roteiros de George Lucas, uma das razões pelas quais ele adorou o filme. A presença de menções ao Journal of the Whills e a presença dos cristais kyber, por exemplo, mostram que nem tudo está perdido e ainda há lugar para o conhecimento gerado, e adquirido, ao longo das últimas décadas na “nova ordem”. E esse convite pode ser suficiente para muitos veteranos retornarem aos recônditos dos livros, quadrinhos, jogos e tudo mais gerado pelos novos filmes. Ou seja, mais um ponto positivo para a miscelânea de gêneros Gareth Edwards.

Sim, miscelânea. Rogue One não é só ficção científica, não é ação, não é só aventura. Ele também é drama, comédia e guerra. Com isso, ele vai além dos demais filmes da Saga, ao forçar mais a mão, especialmente no drama. O arco narrativo da família Erso (a pronúncia parece “Ârso”) é trágico, Jyn Erso (Felicity Jones) carrega o resultado disso nas costas ao longo do filme todo e veste bem o papel de anti-heroína, convertida e força transformadora. Embora as comparações entre ela e Rey devam pipocar por aí, elas têm mais diferenças que similaridades e a maior delas é essencial: Rey vive esperando pelo retorno da família; Jyn não tem para quem, nem onde, voltar; ela quer que o mundo se dane. Essa característica é suficiente para ela se destacar entre a dinastia – e agora dá para usar bem esse título! – de mulheres de Star Wars. Alias, Rogue One é o filme com maior quantidade de personagens femininas por frame cúbico da História da Saga; ele bate todos os outros filmes, JUNTOS.

De fato, a Força dos Outros estava com o diretor Gareth Edwards e Rogue One conseguiu reunir muita relevância e mérito para fazer parte da Saga de Star Wars se dever nada a ninguém. Mas mexer com o passado envolve riscos, nem todas as apostas dão resultado e consequências são inevitáveis.

[O especialista percebe que o analista, roteirista e cinéfilo está olhando de cara feia, então, para evitar o cuecão, ele pega as anotações, limpa o púlpito e sai de fininho]

mais spoilers ainda!

PARTE II: O Lado Negro

[Ansioso, o profissional ajeita os óculos recém-adquiridos, estica a camiseta de Star Wars para todo mundo ver a estampa cheia de referências, olha para a plateia e pensa “Agora vai”]

Em resumo, Rogue One é um filme de, e sobre, guerra. Bom, é Guerra nas Estrelas, não é? Guerra está implícito. Não necessariamente. Na maioria dos filmes, os conflitos militares servem como pano de fundo tanto para a narrativa sobre autodescoberta e amadurecimento quanto para os ápices em grande escala (vide todas as batalhas de abertura/encerramento dos demais filmes). Agora, porém, a guerra é parte da realidade da vida daqueles personagens. Eles sentem seus efeitos e privações, logo, há muito menos idealismo em jogo. Luke Skywalker deseja seguir os passos do pai e, por coincidência o Império estava envolvido; o pequeno Anakin era escravo num mundo sem lei; Rey – até o momento – era quase isso, embora existam indícios de que ela só foi escondida em Jakku até a “hora certa”.

Os habitantes do mundo de Rogue One, capitaneados por Cassian Andor (Diego Luna; em atuação apagada e questionável no princípio, mas depois embala), não têm o luxo do idealismo. É ação ou morte, submissão ou escravidão. Vencer ou morrer. Para mostrar isso, Edwards, novamente, visitou as memórias de George Lucas e vemos diversas referências a soldados e agentes em operação da Segunda Guerra Mundial, e um pouco do Vietnã, assim como as diversas revoluções que moldaram o mundo no século XX. Isso ajudou a elevar o drama mencionado anteriormente, dar veracidade ao que acontecia e fazer pensar “humm, poderia ter acontecido”. Bem, por vários aspectos, já aconteceu, acontece e vai acontecer de novo. É que, dessa vez, as batalhas soaram muito mais reais (pela boa mistura do visual com a necessidade dramática; não há nada descartável ali) e, de quebra, o filme culmina com a melhor cena de combate da Saga – até agora, afinal, o futuro sempre pode nos surpreender. O desfecho da batalha é um show à parte, com direito a um visitante inesperado, e destruição para todos os lados.

O ritmo é um dos maiores méritos de Gareth Edwards, que fez as vezes de um jovem George Lucas com mais pressa e menos história para contar. Há muito movimento em Rogue One, as mudanças de cenário são numerosas e, mesmo nos diálogos mais longos, ele optou por boa movimentação de câmera, variedade de tomadas (apoiadas por um departamento de arte competente e que seguiu a “Escola JJ Abrams” de efeitos práticos) e uma trilha intrometida, presente e cravada de Michael Giacchino (inspirado pelos temas de John Williams, devidamente creditado, aliás). Sem grandes invenções em ângulos ou tomadas impossíveis, ele aproveitou o roteiro de acelerado de Tony Gilroy (Bourne) e saiu da frente, deixando a história se desenrolar como deveria. Não é fácil fazer isso e Gareth sabe. Ele errou feio em Godzilla nesse quesito (e em tantos outros).

No fronte dos avanços tecnológicos, sempre uma marca registrada de Star Wars + LucasFilm, é inevitável citar dois nomes: Grand Moff Tarkin e Princesa Leia. As ressurreições digitais do lendário Peter Cushing e da juventude de Carrie Fisher estão anos luz de distância dos lampejos de acertos em Tron – O Legado, e emocionam os mais saudosistas. O nível de fidelidade dos modelos 3D é incrível e, aliados a movimentos de câmera que evitam o exagero, pode convencer com mais facilidade. Pelo aspecto narrativo, a presença dos dois personagens permitiu uma conexão imediata com Uma Nova Esperança.

A atuação, infelizmente, é o ponto fraco. Diego Luna demora para embalar, Felicity Jones nunca muda muito de tom (a dobradinha Ridley + Boyega funciona muito melhor) e o poderoso, e querido, Forest Whitaker desmorona por trás de uma fachada desinteressante, uma voz esquisita e decisões questionáveis, que incluem a tortura de um personagem sem muita necessidade. Ok, torturar é modo de demonstrar o radicalismo de Saw Gerrera – alias, o Ministry of Silly Names foi ativado para esse filme! -, entretanto, a cena não é tão nojenta ou impactante quanto deveria ser. Quando o roteiro dá o suficiente para começarmos a entender/gostar/odiar/avaliar o personagem, a narrativa muda de foco. É a segunda vez que Whitaker – que é fã declarado de Ficção Científica – faz um alienígena (A Reconquista, alguém?!); e a segunda falha. Mads Mikkelsen não decepciona dentro do estilo estoico dele. Alan Tudyk ganhou as melhores piadas, algumas das melhores cenas e a chance de colocar mais um robô no panteão autômato de Star Wars: K-2SO é irreparável. É como se o homem de lata de Oz tivesse ganhado um coração de irmão, a alma de um comediante e a fúria, e a pistola, de um guerreiro destemido.

Porém, a missão cuidadosamente construída pela trama reduz um pouco o peso de eventuais atuações menos impactantes, pois, como de costume, Star Wars foca nas realizações em grupo – coisa que já passou da hora de mudar, alias – e as peças se encaixam na narrativa.

Tecnicamente, Rogue One está longe de qualquer perfeição; o roteiro perdeu a chance de explorar várias elementos criados por Chris Weiz e Tony Gilroy, a conexão com Uma Nova Esperança não foi tão acertada quanto se esperava e alguns erros de lógica surgiram (por exemplo, o diálogo no qual Darth Vader acusa Princesa Leia de ter recebido uma transmissão de espiões rebeldes só é aceitável com muita força de vontade), assim como aconteceu com Episódio I. Mexer com o passado é perigoso, ainda mais quando o “passado” está apenas há alguns dias de distância.

A crítica mais fácil a Rogue One é o excesso de fan service, as referências só para fãs. A quantidade é absurda, independente de muitas delas serem justificadas (como os líderes de esquadrão rebeldes de Uma Nova Esperança, por exemplo). É divertido ver uma jarra de leite azul, um capacete conhecido aqui, R2-D2 e C-3PO ali, um veículo acolá e tal, mas até que ponto isso ajuda, pode ser considerado desnecessário ou não fazer a menor diferença para quem não conhece? Infelizmente, não consigo avaliar. Entretanto, também não consigo calar o sentimento de que o filme passou boa parte dos dois primeiros atos querendo me conquistar pelo saudosismo. Queria que ele me convencesse por conta própria, sem apelar tanto.

Dentro da narrativa da Saga, Rogue One preenche a lacuna deixada pela criação de Legends – que oferecia algumas respostas óbvias e carentes de revisão – quanto à ausência da frota rebelde, como os planos foram roubados, como Princesa Leia se meteu na confusão, assim como Obi-Wan Kenobi, por que Bail Organa estava em Alderaan. Ao mesmo tempo, levanta outras questões: Em Episódio II, os formigões de Geonosis tinham o primeiro projeto da Estrela da Morte, no UE, escravos Wookies construíram a estação espacial e o engenheiro era outro e, agora, tudo mudou e ficou concentrado nas mãos de Galen Erso (Mads Mikkelsen). E é aí que o novo Universo Expandido entra em cena e, possivelmente, teremos respostas muito em breve.

Porém, Rogue One é o filme mais impactante da Saga, pois ele provoca mais uma transformação de cair o queixo. Durante a composição da Santa Trilogia, sempre vimos o Império como uma alusão ao Eixo, ao totalitarismo, a governos radicais e opressores, logo, a Rebelião lutava pela liberdade, pela causa nobre, pelo que é certo, pelo Lado da Luz em confronto direto com o Lado Negro. Socialmente falando, aqui nos Estados Unidos, Luke era o garoto idealista disposto a tudo para livrar a galáxia do Mal. Era o bom moço e, por tabela, os rebeldes eram os norte-americanos lutando contra a tirania (nazista na Segunda Guerra). Ok, disso todo mundo sabe.

Agora – e aqui vem o maior dos spoilers dessa matéria – TUDO pode ser visto de outra forma. O mesmo Império que aniquilou os Jedi, matou criancinhas, chacinou alienígenas por preconceito e é comandado por um líder que manipulou o sistema político para assumir o poder em causa própria, a partir de Rogue One, também cometeu duas atrocidades pré-Alderaan: a Estrela da Morte faz dois disparos contra duas cidades, Jedha City (civil) e Scarif (em tese, base militar). O resultado são cogumelos atômicos, seguidos por destruição catastrófica de terra. O Império, aquela entidade maligna e detestável, usou o equivalente a bombas nucleares. Duas delas, gerando cogumelos, e instaurando o medo ao ponto de fazer o outro lado ponderar a rendição incondicional. Qual foi a única nação no mundo real que JÁ fez isso? Os Estados Unidos da América. Nada de Alemanha Nazista ou Japão Imperial, em Rogue One, a representação do Império É os EUA. E tudo isso num momento de extrema crítica política, de divisão sócio-política intensa e da ascensão de uma figura que se encaixa na descrição acima. Se pensarmos por esse lado, a partir de Rogue One, a Rebelião luta contra seus próprios fantasmas e o ideal americano por trás de tudo que George Lucas escreveu agora se torna um chamado de batalha, para uma resistência e, eventualmente, revolução. É uma autocrítica poderosa e, mesmo que seja coincidência, chega em momento oportuno e necessário.

E isso faz pensar. Quem está certo? Existe, de fato, esperança numa luta dessa magnitude? Finalmente, Star Wars entra no debate sem aquela obviedade binária de George Lucas em Episódio III. Só por isso, a jornada já valeu a pena.

[O jornalista é empurrado para o lado por uma estátua em tamanho real de Darth Vader, enquanto um sujeito vestido com roupa de piloto rebelde, capacete cinza e com um chaveiro cheio de personagens em Lego toma o pódio. O fã chegou.]

O número de spoilers agora fica maior que o de Jedi mortos pelo Vader!

PARTE III: Esperança

[O fã mata o copo de Coca-Cola e repete para si mesmo “Sou um com a Força e Força está comigo”, umas três vezes, abre os braços e grita:…]

EU SAÍ DE LÁ CHORANDO! A Disney pediu, várias vezes, para não bancarmos o Homer Simpson e estragarmos a experiência de quem estava na fila lá fora, nas ruas internas do estúdio em Burbank. Minhas lágrimas serviam com um spoiler bem grandão, mas, fazer o que? Como segurar? E elas vieram por várias razões.

A primeira foi a emoção do arco dramático do filme. O final chega, sobrecarrega o universo com diversos sentimentos (carinho, dor, perda, esperança, saudade, infância, paternidade…) e as primeiras fichas começam a cair. O reencontro com uma sensação quase esquecida, soterrada por tantas histórias adicionais, por tanta overdose de Skywalker. No começo, ninguém torcia para o Luke. A torcida era pela sobrevivência da base em Yavin 4. Eles eram os bonzinhos, eles precisavam escapar. E, uau, eles escapam.

Só que, agora, com Rogue One, estamos diante de um ciclo que justifica sacrifícios, até então, inimagináveis. Os Jedi foram mortos, a maioria em batalha, lutando pela própria vida. Os soldados clone estavam ali seguindo ordens. Os pilotos rebeldes estavam travando uma guerra civil. Dessa vez, a parada é mais intensa, mais profunda, mais viva. São pessoas fazendo qualquer coisa – matar, abandonar, sofrer e morrer – para evitar que um maníaco tenha a arma mais poderosa da Galáxia. Para dar esperança e mantê-la viva. E o sacrifício extremo entregue pelo desfecho, com o cogumelo atômico varrendo tudo em seu caminho e o espectador aceitando, assim como os personagens, que aquele é mesmo o fim, que a Milleninum Falcon não vai aparecer para salvar todo mundo, é uma porrada forte demais. Talvez tão intensa quanto a morte de Han Solo. Você sabe que vai acontecer, mas se recusa a acreditar até o último instante. E o resultado é devastador.

Foi bom retornar àquela linha temporal familiar, ver rostos conhecidos, reencontrar Tarkin, Leia e ver Mon Mothma mais ativa. Darth Vader teve dois momentos distintos: o primeiro é frustrante, com direito a trocadalho do carilho; o segundo é épico. E valeu todo meu esforço para assistir Rogue One SEM spoilers e sem ver nenhum dos trailers. Muito da empolgação, e da emoção que senti, vieram das surpresas, das homenagens e das peculiaridades da história. Logo, mesmo com alguns tropeços aqui e ali, o filme se sustenta e merece, dentro do ranking da Saga, bater O Despertar da Força e ficar em 2o Lugar logo atrás de O Império Contra-Ataca.

Devo assumir, não botava fé nenhuma nesse filme. Cheguei a chama-lo de erro. Não acreditava em bons filmes de Star Wars fora do eixo principal. Rogue One destruiu minha teoria, colocou um sorriso no meu rosto e lágrimas nos meus olhos. Não podemos pedir mais nada de um filme de Star Wars.

A Força vive, pulsa e tem um futuro lindo pela frente. Cheio de guerra, heróis e, claro, esperança. A rebeldia de Rogue One é prova irrefutável disso.

14 comentários em “[Análise] Rogue One: Uma História de Star Wars”

  1. Barretão…é impressionante como você conseguiu ler minha mente com esses seus truques Jedi rs…

    Vi o filme na pré-estréia e foi dificil conter a emoção do momento.

    Acho que Rogue One abriu um belo caminho para novas adaptações fora da linha principal, adaptações essas que poderão explorar todo o universo expandido.
    Confesso que a primeira aparição de Lord Vader me incomodou muito, na minha mente eu via a cena e algo me dizia “Ele não se movimenta assim”, “Ok, ele impõe medo e respeito, mas por que eu não sinto essa presença vindo dele?”

    Posso ter viajado, talvez um efeito colateral dos jogos antigos onde nosso “vilão amado” tinha a movimentação mais travada.

    Já a segunda aparição, não conseguia me segurar na cadeira, queria levantar e sair correndo junto. “Era isso o que eu imaginava” gritava minha mente!

    Enfim, o filme é impecavel? Não! Mas é muito bom!

    1. Nem os toydorians podem comigo! hahaha

      Então, concordo contigo, o Vader ficou esquisito.. até achei que ele ia rebolar numa hora lá. hehehe.

      A segunda foi bem mais legal.. bem mais “Vader”.. 🙂

      abs,
      Fábio

  2. “Em Episódio II, os formigões de Geonosis tinham o primeiro projeto da Estrela da Morte, no UE, escravos Wookies construíram a estação espacial e o engenheiro era outro e, agora, tudo mudou e ficou concentrado nas mãos de Galen Erso (Mads Mikkelsen). E é aí que o novo Universo Expandido entra em cena e, possivelmente, teremos respostas muito em breve.”

    A resposta já veio. O livro Catalyst: A Rogue One Story, lançado em novembro nos EUA, detalha todo o processo de construção da Estrela da Morte. A leitura vale muito a pena, inclusive.

    Bela crítica!

    1. Fala Igor,

      Ainda não tive tempo de ler. Fiquei achando que Catalyst era tipo uma novelização e não tenho saco para elas.
      Quando sobrar uma verba, retorno ao UE, sem dúvidas.

      Abração e obrigado pela info,
      Fábio

    1. total, fiquei emocionado e empolgado com esse mundo longe dos “supers”.
      e a Força é isso aí, é o que o Yoda ensina, é algo que vai além da biologia.

  3. Confesso que também achei que esse filme não deveria acontecer. Fui ao cinema pq não tinha outra coisa pra fazer. E ainda bem q eu estava completamente errado. Meu filho de 9 anos finalmente entendeu porque Darth Vader dava medo.

    Muito boa crítica Barreto

    Só espero que a Disney não deixe acontecer vários spin offs que baguncem a Santa trilogia ( adorei o Santa)

    1. Berthran,

      Os spin offs virão, mas acredito que de forma conservadora. Começa com o Han Solo… depois deve pintar um Obi-Wan. Aí a gente avalia!

      Obrigado pelo comentário! Feliz por ter gostado!

  4. Texto divertidíssimo de ler, parabéns grande Barretão.
    Algumas curiosidades: (1) O Ministry of Silly Names nunca deixou de atuar, já que Saw Guerrera é um personagem da série de TV ‘Clone Wars’, série essa que não foi para o ‘Legends’ quando a Disney criou o famigerado selo. (2) Os formigões de Geonosis receberam os planos dos Sith, o próprio laser alimentado por kyber é tecnologia sith.
    (3) Sobre a organização que a criação do selo ‘Legends’ deveria ter trazido, saí do cinema um pouco confuso: o (excelente) livro ‘Tarkin’, de James Luceno (autor de ‘Catalyst’, ambos os livros publicados fora do selo ‘Legends’), narra a ascensão de Wilhuff Tarkin de cadete à Grand Moff, e a Estação de Batalha orbita, semi-operacional, o planeta Geonosis. Tentando não causar spoiler do livro, Krennic não é comandante da Estação de Batalha, e sim um outro oficial.

    Só mais um aspecto em que Rogue One foi bastante feliz: Corrigir o ponto fraco da Estação da Batalha e responder a pergunta “Como um projeto tão ambicioso com tanto investimento como a Estação de Batalha de um Império Galático possuía uma falha estrutural tão grave?”. E a resposta é ‘Assista Rogue One’. =)

    E para encerrar (ufa) gostaria de discordar de você. Há um aspecto de Star Wars que me cativa mais que todos os outros que é o seu Universo, seu cenário. E eu sempre sonhei que um dia o grande público pudesse apreciar algo além dos Jedi, dos Skywalkers. E desde que foi anunciado um filme fora desse núcleo eu vibrei e esperei ansioso. Nesse ainda tivemos um sabre de luz sendo acionado, tomara que no próximo Star Wars Story nem seja mais preciso.

    1. Pois é, nem é discordância, também quero ver um filme de SW sem Jedi. A galáxia é muito grande, milhões de histórias a serem contadas.

      Não li Catalyst nem Tarkin. Assim que as coisas melhorarem eu volto a comprar o Universo Expandido. Legal saber que já abordaram tudo isso. Valeu pelo toque!

      Abração!

  5. Olá Barreto,

    que texto lindo! É a melhor crítica que li até agora (e olha que estou lendo todas!). Também gostaria de parabenizar pela iniciativa de usar a voz do Paulo Carvalho como guia para a leitura. Li o texto duas vezes.

    Sem sombra de dúvidas falar sobre SW mexe com nossos corações e muitas vezes fazer uma análise fria e distante é bastante problemática, mas acredito que sua análise contemplou elementos que eu não tinha pensando como a analogia com os EUA.

    E considero, como você, que o fan service (não sei se é assim que se escreve) é demais e faz do filme algo problemático para quem deseja iniciar a saga por ele.

    Fora que o desenvolvimento dos personagens é problemático também, como você bem apontou, me importo mais com as consequências das ações dos personagens do que com os seus destinos.

    Obrigado pelo excelente texto.

    Abraços.

    1. Fala Lucien, que honraria ver o senhor por aqui! 😀

      O projeto com o Paulo é ambicioso, faremos isso de forma semanal a partir de 2017, com uma seleção de textos do site. Vai ser o primeiro passo do meu retorno ao jornalismo cultural. 🙂

      E fico feliz pelo texto ter ressoado contigo, pois realmente é preciso mergulhar um pouco mais nas mensagens de obras de grande exposição para entender se há, ou não, alguma coisa a mais ali. Por isso parei de escrever, sabe? Muitos filmes vazios, não tinha nada a dizer sobre eles. Felizmente, Star Wars não decepciona (quando é depois da Trilogia Infame, claro; aquela timeline é desinteressante do ponto de vista de subtemas) e sempre provoca momentos como esse.

      Esse negócio dos Estados Unidos está me tirando o sono – assim como os Trumpistas, pois estão até tentando boicotar o filme – mas boa cultura é assim, promove debate, muda pensamento e faz a gente rever conceitos. Pena que para muitos é “só um filminho”. :

      abração!

Comentários encerrados.

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