LOS ANGELES – Hello, Stranger (Cher-eum Man-nan Sa-ram-deul, Coréia do Sul, 2007, 113min) começa de modo simples, com tomadas de árvores e uma pequena vila no Vietnã. Alguém grita por uma jovem desesperadamente. Não a encontra, grita seu nome e se cala. Mudamos rapidamente para a Coréia do Sul, onde um grupo de dissidentes do Norte termina seu curso de adaptação ao “novo mundo” do capitalismo e dos hábitos mais evoluídos. E é pela ótica desses imigrantes que o público é apresentado a Seul e à sensação claustrofóbica vivida por uma pessoa que não tem sequer a noção do que é um caixa eletrônico ou uma megastore. Esse filme foi um dos meus destaques do LAFF.
Curiosamente, a primeira impressão técnica chama a atenção, especialmente pelo hábito de acompanhar a qualidade de equipamentos e filmes utilizados no Brasil. Uma imagem crua, pela ausência de tratamento e certa deficiência do material dá um ar de filme amador da década de 70. Tudo isso combina, porém, com o olhar de quem vê tudo pela primeira vez. Ainda sem amadurecimento suficiente e conhecimento necessário para enfrentar esse novo mundo – capitalista, no caso do personagem; e tecnológico, pelo lado da produção.
É muito interessante fazer essa comparação de “escolas” e constatar que a qualidade brasileira deu realmenete um salto no âmbito cinematográfico. Dá aquela impressão de que não falta tanto assim para criarmos um cinema comercial lucrativo. Arte e negócios precisam andar juntas aqui, não tem jeito. Sem uma produção constante e capaz de impulsionar as bilheterias, o cinema autoral acaba ficando em segundo plano. Acredito que todo mundo que se propõe a fazer um filme tenha um objetivo: expôr seu produto para o máximo de gente possível. Os intelectualóides podem dizer publicamente que ficam felizes quando 16 pessoas “altamente influentes” assistem a uma sessão das 16h no Espaço Unibanco, mas duvido que alguém reclamaria de ter sala lotada no Shopping Iguatemi! Enfim, esse contato com outras escolas tem valorizado muitos aspectos do nosso estilo e qualidade.
Voltando ao filme, Jon-woon é o personagem principal. Vindo do Norte, onde deixou toda a família, é um sujeito simpático, simples e bondoso, acima de tudo, mas é inocente ao extremo. Em sua jornada, ele conhece uma dissidente que trabalha como taxista e, selando seu destino, um imigrante ilegal do Vietnã – a voz desesperada do início da projeção.
A direção e roteiro de Kim Dong-hyun, porém, não permitem que o filme seja um mero drama sobre imigração. Há muito bom-humor e sentimentalismo envolvendo a introdução de Jon-woon a sua nova pátria. O personagem é carismático e altruísta – em excesso, em certas ocasiões. Esse exagero sinaliza uma das deficiências do filme, pois não permite decisões medianas ou mesmo a inabilidade de decidir, tudo é sempre intenso e rapidamente resolvido. Um instinto pró-ativo comanda a obra.
Imigração pode soar como o tema primário, entretanto Hello, Stranger é essencialmente um filme sobre a comunicação e as mazelas provocadas por sua ausência ou complicações. A realidade da Coréia do Sul não representa nada para Jon-woon – sua grandiosidade assusta – e seus códigos de conduta o sobrecarregam. Logo de cara, em seu primeiro dia como cidadão, ele se perde. Sai de casa sem o endereço e não consegue voltar. Embora tenha seu conteúdo dramático, as seqüências são engraçadas. Já o vietnamita não fala coreano, é explorado por um patrão mau-caráter e fica sem dinheiro. Recorre a um roubo para tentar, numa última carga gloriosa, encontrar a namorada.
Os dois se reúnem e improvisam uma comunicação que permite a Jon-woon entender a situação parcialmente e ajudar o garoto desesperado. Daí para frente, segue uma série de confusões de interpretação. Um não entende as reais razões do outro, descobre-se o paradeiro da namorada – uma entre tantas noivas vietnamitas vendidas para trabalhadores em vilas distantes – e uma das cenas mais marcantes. Num quarto de hotel, tarde da noite, os dois expõem mais ainda as dificuldades de comunicação ao tentarem se consolar, em línguas diferentes, deduzindo erroneamente a situação do outro e abrindo a ferida da dor causada por suas decisões. Bela mistura de humor e bom drama.
Embora tenha uma assinatura visual empobrecida, o filme promove um passeio por Seul e várias regiões próximas, mas se constrói nos momentos intimistas dos personagens e na boa atuação de Park In-soo (Jon-woon), que transborda de emoção e carisma.
Hello, Stranger foi meu segundo contato com o cinema sul-coreano. O primeiro foi O Hospedeiro, competente filme sobre monstros e grande surpresa nas bilheterias brasileiras. Duas obras distintas em gênero e qualidade técnica, mas que mostram uma escola esforçada, com bons resultados e profissionais capacitados. Embora não seja nenhuma obra de arte, o longa-metragem faz por merecer o tempo do espectador. Pelo menos aquele gosta de drama.