Gente Que Escreve 005 – A Jornada do Vilão

Bem-vindos escritores, amantes da literatura e do entretenimento!

Nesse episódio do Gente Que Escreve, conservamos sobre a “Jornada do Vilão”, as características de grandes vilões e a transição recente de encarnações do Mal a frutos do meio. Entenda o que significa ser um vilão hoje em dia e também tentamos responder à pergunta: é possível escrever um romance no qual o vilão seja o protagonista e ainda ser considerado comercial?

APRESENTAÇÃO

Fábio M. Barreto & Rob Gordon

EDIÇÃO

Fernando Barone

MÚSICA TEMA

Daniel Bellieny

LINKS RECOMENDADOS

C.O.N.T.E. – Curso Online de Técnicas para Escritores do Barreto. INSCRIÇÕES ABERTAS!

Championship Vinyl – Blog do Rob Gordon.
Championship Chronicles – Blog de Crônicas do Rob Gordon.
Filhos do Fim do Mundo – romance premiado do Barreto.
Amazon – e-books do Barreto
Textos do Adão – coleção de textos estrelados pelo Adão, do Rob Gordon.

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SUGESTÕES, CR͍TICAS E DÚVIDAS

Envie e-mails com “Gente Que Escreve” na linha de Assunto para: fmbescritor@gmail.com

74 comentários em “Gente Que Escreve 005 – A Jornada do Vilão”

  1. Gislene dos Santos Carvalho

    Outro exemplo de personagem que começa bom e vai se deteriorando em séries é o Walter White de Breaking Bad. A série é toda uma saga sobre a corrupção do “Homem Bom”.

  2. Bom, antes de mais nada, obrigada por dedicar um episódio inteiro sobre o assunto! No que tange vilões em histórias, acho que esse é um assunto que rende várias discussões interessantes, não apenas em termos de narrativa e construção de personagens como também em termos de moralidade, como vocês mesmos mencionaram diversas vezes.
    No entanto, enquanto eu ouvia o podcast, ficou outra dúvida (várias, na verdade), mas essa mais em termos de conceitos: qual é a diferença entre um vilão, um antagonista e um anti-herói? Desses três termos, quais são essencialmente sinônimos? Se pegássemos, por exemplo, o Darth Vader e o transformássemos no protagonista da história e seguíssemos o ponto de vista dele durante a trilogia clássica, o Luke e sua trupe passariam a antagonizar a história, mas o Vader seria considerado o herói? Temos até o próprio caso dos filmes Meu Malvado Preferido: o protagonista é um vilão de histórias, os antagonistas da história também são vilões, mas por estarmos seguindo o ponto de vista do Gru, ele é necessariamente um herói? Por que um vilão necessariamente exige a presença de um herói? Todo personagem precisa de um antagonista?

    Uma coisa que o Thiago comentou um dia desses quando estávamos conversando sobre o assunto foi justamente o lance de “por que história que protagoniza vilão não vende”. O que ele mencionou foi que “para você criar uma boa Jornada do Vilão, você precisaria essencialmente criar um personagem bom e transformá-lo em alguém que você detesta”. Você precisa necessariamente não gostar do vilão/não concordar com as motivações dele para que ele seja um bom vilão? Se ao final da Jornada do Vilão você concordar com as motivações dele, ainda que ele tenha terminado a história completamente corrompido, ele continua sendo um vilão ou ele se tornou um anti-herói?

    1. Bom, vamos por partes.

      A forma que eu enxergo é a seguinte: o protagonista é o personagem central da trama. Ele é o herói da história, independente do alinhamento moral que ele tenha. O antagonista é o seu oposto, o adversário, o inimigo a ser derrotado. Agora, vamos falar de heróis. Você tem o herói clássico, que todos conhecemos; mas também tem o anti-herói, que pode ser o herói da sua história, mas sem os mesmos atributos morais de um herói. E o vilão que está ali, independente de sua trama ter um herói ou um anti-herói. Ele é o sujeito que o protagonista vai derrotar.

      Você pode ter uma história, por exemplo, com dois vilões (moralmente falando) onde um deles é o seu herói. Aqui, a gente cai no exemplo do Poderoso Chefão novamente: Michael (ou Vito, como preferir) Corleone são tão vilões quanto o Barzini. São mafiosos, líderes de crime organizado. Mas os Corleone são os heróis da trama, você começa a ver que não é a moralidade dele que é dúbia, mas sim a imoralidade. É um assassino que se preocupa com sua família. É um criminoso que tem um senso moral – o filme nunca indica isso, mas o livro deixa claro que Vito Corleone detestava prostituição, achava errado. Ou seja, ela está acima do Barzini, que é vilão assumido.

      Mas o exemplo que eu mais gosto é o que citei no podcast, do Justiceiro. Numa história, sei lá, do Homem-Aranha, ele pode ser um vilão. Mas, numa história solo, ele se torna o seu (anti)herói, e o vilão é quem quer que ele esteja combatendo. Linkando isso ao seu exemplo do Meu Malvado Favorito, ali nós temos outro bom exemplo: ele é o herói da história, mas não é o herói do universo em que ele habita. Lá dentro, ele é vilão. Mas, aos olhos do leitor, ele é herói. E isso, respondendo sua última pergunta, vai além da motivação dele – especialmente quando o personagem é construído de forma rica. Vamos falar de Chefão mais uma vez? Eu adoro a quase-obsessão do Michael Corleone em manter sua família segura. Me identifico com isso. Mas o que separa ele de mim, como espectador / leitor, é que eu não ordenaria o assassinato de cinco pessoas ao mesmo tempo, em pontos diferentes da cidade, enquanto estou no batizado do meu sobrinho. São cinco homicídios: em Nova York, ele é um vilão. No mundo real, ele é (teoricamente) um anti-herói – coloquei o teoricamente aqui porque, na minha visão pessoal, ele é um herói trágico, corrompido por uma força maior que a dele e passando sua jornada inteira atrás de redenção.

      PS – Encham a caixa de e-mails do Barreto EXIGINDO um programa sobre Chefão! <3

      Beijos

      Rob

  3. Olá Barreto e Rob!

    Fiquei muito surpreso quando ouvi este podcast e descobri que haviam lançado um desafio para escrever um texto usando as palavras “Anjo” e “Elevador”.
    Por incrível que pareça, eu já tinha feito um conto assim. Inclusive com estas palavras na mesma frase.

    Vou postar aqui para os colegas analisarem e criticarem à vontade.

    Sucesso!

    Sabrina

    O silêncio no apartamento estava ensurdecedor. Não conseguia dormir até que lembrei de um serviço que um amigo havia comentado. Liguei e uma voz suave e prestativa me atendeu. Meia hora se passou desde o combinado, até que o porteiro ligou perguntando se a senhorita Sabrina poderia subir.

    A porta do elevador se abriu e revelou um anjo. O coração bateu mais forte. Nunca havia feito isso e não tinha certeza de como me comportar.

    – Fique à vontade. Bebe alguma coisa? Um vinho talvez?

    Loira com lindos cachos e pouco mais que uma adolescente, também não mostrava experiência no assunto; seu nervosismo era aparente. O fato era que sua beleza deveria valer os R$ 500,00 que pediu que eu colocasse na mesa.
    Tomou o vinho de um gole e tomou outra taça de um fôlego só. Em um repente de decisão, começou a se despir. Nua e ainda de sapatos altos, veio até mim e me despiu também.

    – Como você prefere – perguntou com a voz já embargada pelo álcool.

    – Deite ao meu lado. Depois eu decido.

    Fez um expressão de surpresa, mas me atendeu.
    Puxei-a ao meu encontro e o silêncio havia sumido. Ela me abraçou e se ajeitou confortavelmente em torno de mim. Acariciei seus cabelos, toquei sua face e beijei seus olhos. Abracei-a como que para protegê-la.

    – Você é linda – sussurrei sinceramente.

    Ela me abraçou mais forte e irrompeu em um choro sentido. A dor em lágrimas escorria e molhava meu peito. Aquilo ela não sabia fingir. Entre soluços e carinhos, dormimos sem perceber.
    Acordei com o dia me chamando. Ela não estava mais ao meu lado. A princípio pensei ter sonhado, mas foi só passar os olhos pela mesa e ver o dinheiro, que a memória voltou. Junto das cinco notas havia um papel dobrado com um bilhete:

    ‘Cobrei o programa mas em seguida resolvi
    pagar pelo seu maravilhoso serviço.
    Vou recomendar para minhas colegas.
    Quero 20%.
    Beijo,
    Sabrina’

  4. A Descida

    O painel digital mostrava os números dos andares diminuindo, ao passo que o anjo Eymael sentia seu coração mais pesado. 899, 898, 897…

    Olhando rapidamente a sua volta, ele julgou aqueles outros seres inferiores, os quais fingiam não prestar atenção nele. Todos estavam engravatados e alguns carregavam pastas, provavelmente banqueiros ou advogados. Todos corruptos naturalmente. Fediam a dinheiro sujo.

    “É a primeira vez que pega o social?” Perguntou um dos engravatados de pele esverdeada e sotaque caipira.

    “Não é da sua conta.” Respondeu Eymael, curto e grosso.

    “Ah… Enteno.” O pequeno demônio ajeitou os longos cabelos cinzentos “Mas se tem hora marcada com o Chefe é bom se consultar primeiro. Nunca se sabe os termos que Ele vai propor nos acordos e faço muitas consultorias, meu pixuleco é bem camarada…”

    O consultor infernal parou ante o olhar de ódio fulminante lançado pelo querubim. A rixa entre céu e inferno era conhecida por todas as criaturas místicas, e geralmente os celestes obliteravam os seres do abismo. Contudo, algo ainda instigava aquele pobre diabo e Eymael já aproximava a mão da espada curva. Faltava pouco e o anjo rezava para ter um pouco mais de paciência e sair dali. 754, 753, 752…

    “Não há necessidade de violência, companheiro” Disse um outro diabo barbudo e de língua presa, “O companheiro José só estava sendo cordial, ele nunca viu um celeste tão de perto…”

    “Não me enche, cara!” Respondeu o anjo com rispidez.

    “Calma, companheiro! Seu problema é essa asa quebrada? Vamos discutir isso tomando uma! Eu te apresento pra um companheiro médico, faz muito aborto lá em Caetés e…”

    Eymael odiava estar ali assim como odiava seus superiores. Sentia grande repulsa por aqueles demônios engravatados. Odiava aquele papo no elevador. Lembrou-se dos tempos em que podia voar para onde quisesse. Tinha uma certa admiração pelo brilho delas ao sol. Mas agora a asa quebrada por seu Superior ao ser expulso do paraíso apodrecia. Provavelmente iria cair logo. Já a outra asa enegrecia. 732, 731, 730…

    Os demônios agora tentavam lhe explicar um elaborado esquema para arrebatar mais almas para o grupo deles, ou como chamavam ironicamente, para a Igrejinha. Eymael aprendeu a tolerar muitos pecados durante sua existência, mas não tolerava a corrupção. Olhou ao redor mais uma vez. O anjo tinha poder para aniquilar todos, deceparia suas cabeças! Cada vez mais o ódio tomava conta dele. 720, 719…

    Lembrou-se do que seu superior disse durante o treinamento. Por que anjos não podiam se revelar para os humanos que protegiam? Por que não podiam dizer o que sentiam? Por que era tão fácil pecar? 706, 705… Quanto ódio! Apertou mais algumas vezes o andar desejado como se isso fosse fazer o elevador descer mais de pressa. Os demônios agora riam dele, de como era patético tentar resistir e como todos acabavam se corrompendo cedo ou tarde…

    Eymael apertou o cabo da espada com ainda mais força e fez menção de iniciar um golpe. 668… 667… 666. O elevador parou. As portas se abriram e toda luz do local se extinguiu. Um par de olhos vermelhos brilhou em meio a escuridão que logo se moveu com incrível velocidade. Ouviu-se uma risada maligna, e depois o silêncio…

    1. Cara,

      Adorei seu texto. Adorei a construção, o desenvolvimento e o final, deixando tudo em aberto. O cenário está todo ali. A única ressalva que eu faço é sobre as analogias políticas. Eu não coloco esse tipo de menção em textos – a não ser que isso seja essencial – por um motivo simples: o sujeito que se ofender com isso – e vai ter muita gente assim – vai enxergar apenas isso no texto, e, só e somente por causa disso, detestar sua história. Sim, as pessoas levam política e futebol para esse lado, com aquela incapacidade de rir de si mesmas ou do que elas gostam. Eu não usaria esses recursos, evitando o risco de sua história, mesmo boa, deixar de ser vista como uma história boa e passar a ser vista como “panfletária”. Não corra esse risco, não vale a pena. 🙂

      1. Poxa valeu Rob! Fiquei até mais motivado agora. Eu estou tentando me preocupar menos com as estruturas e mais com os personagens e a história, e parece que tá dando certo rs

        Sim vc tem razão as pessoas andam muito intolerantes hoje em dia. Particularmente nesse conto fiquei imaginando demônios engravatados e foi o que veio a mente. No geral eu atiro para todos os lados sem preferência alguma, mas nesse conto deu no que deu e realmente exagerei.

        Obrigado por ter lido e comentado! Abraço e até a próxima.

  5. Hora solene

    Roberto cruzava a multidão a passos largos. Era ovacionado de um lado e vaiado do outro. O segurança fazia o que podia, mas eram muitos, e logo perdeu o controle da situação. Dentre xingamentos, a selvageria começou, socos e chutes vinham de todos os lados, até mesmo placas usadas pelos manifestantes viraram arma. Ele sentiu alguns golpes no corpo e na cabeça, mas logo se livrou da multidão ensandecida e finalmente adentrou seguro ao prédio.
    Soltou um suspiro profundo ao caminhar em direção ao elevador, que por sorte, já estava com a porta aberta esperando por ele.
    Apertou automaticamente o botão do 10° andar, mas sentiu o elevador descer. Apertou novamente repetidas vezes o mesmo botão, mas sem resposta. O elevador parecia ter travado seu destino e não pararia até alcançá-lo.
    – Maldita coisa velha! – disse.
    – Irritado, pastor? Nunca imaginaria alguém como o senhor desse jeito… mas quem sou eu pra julgar… sendo um homem de Deus ou não, você ainda é humano, com todas suas qualidades… e defeitos. – disse o homem atrás dele.
    Roberto não havia notado sua presença até então. Podia jurar que não havia ninguém no elevador quando entrou.
    – Desculpe, não o vi ai.
    – Não me viu chegando, não é?
    – Eu… te conheço? – perguntou olhando o homem de cima a baixo – Desculpe a indelicadeza, é que moro aqui já a algum tempo e não me lembro de telo visto.
    – É que acabei de chegar… e de qualquer forma, não vou ficar muito tempo.
    – Entendo.
    – A multidão lá fora parece muito nervosa.
    – Já estou acostumado. Mas quando for presidente, eu… – ele se interrompeu dando mais uma olhada no homem atrás dele.
    Ele não podia deixar de notar sua aparência elegante, que apesar da pele pálida, tinha uma figura imponente que impunha respeito ao olhar. Sua altura obrigava Roberto a olhar para cima, coisa rara, pois ele tinha orgulho de não precisar olhar ninguém de baixo com seus 1,90 m. Isso com certeza ajudava na imagem. O terno negro como as sombras do fundo de um buraco escuro se encaixava como uma luva em seu corpo magro.
    – Belíssimo terno! – elogiou com um sorriso – quem é seu alfaiate? Com certeza é alguém de muito talento. E deve ser caro também! – sorriu novamente.
    – O que é isso, pastor. Não sou alguém de posses como o senhor, este terno não lhe caberia, e muito menos lhe seria merecido usar qualquer coisa de onde ele veio. Como posso eu, competir com seu relógio de ouro, terno de linho fino, perfume caro e anéis com diamantes. Para homens como você, o status é tudo, então deve mostrar sua superioridade aos seus seguidores, estabelecendo assim, a imagem de líder. Eu não sou assim, até porque não lidero ninguém, tenho um dos piores trabalhos que se possa ter, apesar de as vezes ser bem satisfatório!
    Roberto torceu o nariz. O estranho era mais excêntrico do que imaginava.
    – Por que esse elevador nunca chega? – começou a se perguntar. Abaixo do térreo havia apenas o estacionamento, que não demorava tanto assim a chegar.
    – É uma longa viagem! Estamos indo até o encontro de um de meus irmãos. Seu trabalho reflete muito nele. E claro, seu apelido de apóstolo é de uma ironia que meu irmão adora! – pela primeira vez, sorriu.
    – Do que caralhos está falando?
    – Hoje é o dia de colher os frutos das árvores que plantou! Estamos indo para sua nova casa. A casa que construiu para si todos esses anos enquanto enganava pessoas, fazendo uma mulher com elefantíase na perna correr pelo templo acreditando que estava curada mas apenas estava piorando sua situação, ou quando contratava péssimos atores para fingir possessões demoníacas a fim de fazer seus fiéis doarem parte de seu miserável salário para lhe garantir o conforto de dirigir uma bela Mercedes. Mas tenho que confessar, você é um homem muito eloquente, consegue inspirar seus fiéis a fazerem o que quiser, nem que seja agredir os hereges ou não cristãos nas ruas. Meu irmão gosta de pessoas assim, como você. Afinal, ele próprio é considerado o pai da mentira, vocês são como pupilos para ele.
    – Que absurdo é esse seu maluco de merda!?! Posso te processar por essas acusações falsas e tirar tudo que tem, inclusive esse terninho que segundo você é bom demais pra mim! Aliás… como disse que era seu nome mesmo?
    – Eu não disse. Mas pode me chamar de Abaddon – disse puxando a mão do pastor para sua, dando um aperto forte – Como é um homem religioso deve saber que sou um anjo… o anjo da morte pra ser mais exato.
    Roberto soltou uma gargalhada nervosa.
    – Anjo da morte!?! Quer me fazer acreditar que morri, por acaso?
    – E é preciso fazer alguém acreditar na verdade? De fato você não notou quando cheguei, mas neste exato momento seu corpo está em uma ambulância. Tentaram fazer de tudo, mas as pancadas que recebeu na cabeça foram tão brutais que seu crânio se partiu como um melão.
    Ele tocou a cabeça e sentiu um líquido úmido e viscoso lambuzar seus dedos. Ao olhar a mão, viu o vermelho carmesim confirmando as afirmações do anjo.
    – Mas… como… você disse… sou religioso… um homem de Deus… como posso merecer o inferno?
    – Acho que não prestou atenção no que eu disse. Sim, você conhece a bíblia que foi escrita e reescrita ao longo das eras, sim você possui uma igreja em nome de Deus, mas aquele exagerado templo não faz jus aos ensinamento que o messias passou. Não se trata de se reunir uma vez por semana, orar pedindo saúde a sua família e paz ao mundo, quando passa direto por um esfomeado na rua fingindo que não o viu e arrumando desculpas em sua mente para não tê-lo ajudado, conseguindo assim, se sentir melhor consigo mesmo. Não… não se trata de gritar com eloquência aos quatro ventos que é um homem bom… se trata de ser um homem bom!
    As lágrimas transbordaram de seus olhos quase o deixando cego, então se jogou aos pés de Abaddon, agarrando suas pernas com força, como uma criança buscando refúgio nas pernas do pai.
    – Por favor… eu me arrependo… me arrependo de tudo o que fiz… sei agora que foi errado… só quero fazer as pazes com meu senhor… e ir ao reino dos céus…
    – Sua fala bonita não funciona aqui. Mas sim, você vai de encontro ao seu senhor… mas ele não é quem você esperava…
    As portas do elevador se abriram. Para Abaddon, um vácuo negro se mostrava a sua frente, mas Roberto via algo, algo que o fazia gritar como um animal sendo abatido, repetidas vezes, até finalmente ser puxado para a imensidão negra, e o silêncio voltar a reinar nos ouvidos do anjo.

    1. Adorei essa história.

      Destaco dois pontos que me chamaram muito a atenção. Primeiro, a forma natural que você encontrou de descrever o pastor fisicamente, encaixando tudo dentro da história. Segundo, o “Do que caralhos está falando?”, que diz TUDO o que precisamos saber sobre o caráter do pastor. Muito boa!

  6. A mediocridade

    Pode parecer bobagem ou coisa de algum Anjo sem noção novato e sem nada pra fazer. Mas estou aqui na terra em em cima de um elevador num edifício de 100 andares enquanto vejo seres humanos que se acham tão especiais quanto a mais medíocre pedra de marte. Daqui de cima consigo ver tudo, pequenas formigas homo sapiens e seus probleminhas. Sempre me perguntei o porquê desses seres se odiarem tanto. Não sei bem se a mortalidade os faz ser tão pequeninos perante tudo ou se é o ódio genético passado pelos seus antepassados que tinham que lutar para sobreviver num mundo animal em que só os mais fortes sobrevivem. Do que estou falando? Tudo continua igual.
    Veja o José. Ele está na casa da vizinha enquanto sua mulher está no salão de beleza, fazendo as unhas, fofocando com as companheiras sobre como sua vizinha é uma vadia. No supermercado ao lado, o Eduardo está a despedir o Alex que foi pego roubando leite infantil para seu pequeno filhinho prematuro que acabou de nascer. O coitado é alérgico ao leite materno e precisa de um leite especial, sem lactose, que custa os olhos da cara. É justa causa.
    – Eu sou um Anjo e estou deixando tudo isso acontecer. O que tenho a ver com isso? Não me enche o saco. Tenho ordem expressas de não interferir.
    – Pois deveria. Você é um Anjo, seu trabalho é impedir que isso aconteça ou pelo menos consertar as bobagens.
    Em apenas uma fração de segundo, o anjo pulou do prédio em direção ao Alex. Pensava nas possibilidades de como poderia consertar tal feito. Cortava o vento como uma foice. Via o Alex se aproximar de uma ponte. Esse era teu medo, o pior caso possível seria o suicídio. Se o sujeito soubesse qual era teu destino. Caiu no chão como uma pena e centenas de carros passavam a todo instante cuidando de suas próprias vidas e um pobre coitado se preparava para pular. O Anjo parou o tempo e o segurou pela camisa e o levou para cima do elevador.
    – O que pensas que estás fazendo, humano? – Falou com uma voz estridente.
    – Eu… eu não vejo mais sentido em viver. Não tenho como ajudar em casa. Tenho vergonha de mim mesmo. Não consigo fazer nada. Por que está aqui? Veio me ajudar?
    – Estou aqui para mostrar um caminho. Sente-se e se admire. Se quiseres ainda se matar não vou te impedir.
    Concordou Alex ainda com os olhos admirados com tal situação.
    O tempo voltou, tudo se acelerou, mal podia acreditar no que via. O nascimento da terra, os animais, o surgimento do ser humano, a descoberta do fogo até hoje. Tudo pareceu um download direto pro seu cérebro. pernas ao chão, os olhos para cima, colocou-se de pé e olhou para o anjo.
    – Chega! Está na hora de voltar. Faça o que quiser.
    Ao voltar pra casa, disse para a mulher o que tinha acontecido. Perdeu o emprego, mas se encontrou com um Anjo e sua vida estaria mudada para sempre. Falava sobre humanidade e universo. Não dormia e comia muito pouco, escrevia sem parar símbolos desconhecidos. A linguagem não fazia sentido, passou a escrever nas paredes e até com seu próprio sangue. A mulher se socorria a quem pudesse e não havendo outra opção foi internado num hospital para loucos.
    Não tardou a ser visitado por padres de várias igrejas até que veio um homem alto com vestes e capuz branco. Em seu leito Alex estava delirando e falando coisas sem sentido e sorrindo muito. O homem tocou em sua cabeça e o tempo parou. Alex voltou a si por um momento.
    – É você, Anjo? Veio me levar? Qual teu nome?
    – Meu nome é Azrael. Vamos.

    1. Joseilton

      Eu gostei bastante da ideia do texto e de todo o conceito da história, mas acho que ela podia ser melhor desenvolvida. O começo é muito bom, com o anjo divagando (eu tiraria o “vadia”, pois não combina com a linguagem que ele está usando, mais distante e formal). Mas, a partir disso, a história tem alguns trechos confusos. O leitor entende o que está acontecendo, mas fica difícil visualizar o que está rolando em cada trecho.

      Outra coisa complica é que usa narrativa em terceira pessoa depois de abrir em primeira pessoa,. Um conselho: se você vai usar somente o início em primeira pessoa para colocar os pensamentos do anjo e depois partir para a terceira pessoa, você precisa diferenciar os pensamentos da narrativa da história – talvez usando itálico?

      Enfim, não desista da ideia. Ela é boa e tem potencial para um texto ainda melhor. 🙂

      Abraços!

  7. Mais um ótimo programa (melhor até agora)

    Lembrei de um livro, curiosamente infanto-juvenil, muito oportuno e trata exatamente da construção da vilania: Eu Sou Gênio De Maldade Inenarrável E Quero Ser Seu Presidente De Turma. Josh Lieb.

    O livro é de humor negro, a cabeça de um psicopata de 8 anos. Eu achei muito interessante.

  8. Guilherme de Souza Menezes

    Olá!

    Ótimo podcast. Parabéns pelo trabalho.

    O microconto:

    José cruzou toda a cidade ainda de madrugada. Seu trabalho começava cedo, e sempre gostou de ser pontual. Dez anos trabalhando no mesmo elevador. Ganhava generosas gorjetas e raros sorrisos. Ele tinha noção que era visto como um personagem acessório para as magníficas histórias de vida dos milionários que se hospedavam no Copacabana Palace. Estava mais para personagem esquecido em seus indecorosos livros contando como se livraram do vício de comer quindim e brigadeiro. Podiam falar qualquer tipo de droga ou distúrbio, mas para ele, ricos tinham a prerrogativa de saúde pelo dinheiro que tinham. Ser um viciado em cocaína quando se tem todo o dinheiro do mundo para a melhor clínica de reabilitação é bem mais fácil quando o contracheque do seu pai não chega a dez mil.
    Pensava em sua própria história de vida, mas não tinha muita coisa a dizer. Zé Gaudano era filho de pedreiro. Decidiu muito novo ser jogador de futebol, mas lhe faltava o talento. Queria ter criado um grupo de pagode, mas suas mãos mal tinham competência ao Tantã. Quis ser mulherengo, mas se apaixonou pela primeira garota que beijou. O único talento em que tinha, mas não queria em primeira instância, era escrever. Tinha um caderno cheio de poemas, músicas, contos e até alguns livros.
    “Pobre não vira escritor!” dizia seu pai.
    “Pobre vira ascensorista! Vai caçar um emprego!”
    – Eu detesto esses elevadores, sabe – O primeiro dos três homens que entraram no térreo cumprimentou apenas com a cabeça. Os sujeitos pareciam dois advogados e um ator de cinema. Bonitos, possuíam dentes tão brancos que o plano odontológico que tinha chegava a gemer. Ternos caros, bem cortados, mas o homem do meio usava um paletó azul céu com calças brancas, enquanto os outros dois se atinham ao sóbrio preto.
    – Acho claustrofóbico demais. Ao meu ver foi a pior invenção dos homens. O que você acha, José? – A voz do primeiro ecoou pela caixa metálica já fechada.
    – Zé? – O homem colocou a mão no ombro do rapaz, que se virou assustado. Fora a primeira vez que havia recebido um toque de alguém ali.
    – Ah… Eu acho… Apertado.
    – Não disse a vocês? Até ele, que trabalha aqui, acha apertado! Acho que elevadores deveriam ser maiores.
    – E com vista panorâmica. Perde-se muito enquanto você parece andar em uma veia no meio do concreto. Bom dia, Zé. Como você está hoje? – O homem descolado perguntou. Tinha um rosto amigável, quase pueril, em meio dos cabelos castanhos muito cacheados.
    – Ahm… Vou bem, senhor.
    – Não assustem o pobre homem, vocês dois, seus tolos. José, nós te conhecemos desde que você ainda não existia – O Terceiro, loiro, alto, forte e sério, disse com uma voz forte.
    – Isso não é assustar, Miguel? Você é o rei da suavidade, sabia? Pedras chorariam com você. Zé, não precisa se desesperar. Oi, meu nome é Rafael. Estes são Gabriel e Miguel – O primeiro, de cabelos pretos e óculos de aro grosso, sorriu como um médico pediatra. José manteve a compostura, mas já estava estranhando o papo dos três homens. Já havia escutado histórias por entre o hotel. Sempre tem um dia que você é premiado com um hóspede louco. Mas ele tinha tirado a sorte grande. Três, de uma vez? Deveria jogar na…
    – Mega Sena? Ah, José! Você é um cara maior do que isso. Maior do que dinheiro! – O homem que seria o tal Gabriel cruzou os braços, de certa forma magoado.
    – Um cara que escreve coisas tão bonitas! Você é um artista, José! Não um ascensorista.
    – Para qual andar os senhores irão? – Zé, já incomodado e um pouco temeroso, perguntou com o máximo de educação que poderia ter.
    – Já estamos subindo. Você já sabe quem somos. Sua mãe guarda medalhas nossas do lado de sua foto, não é? – Miguel falou como um pai. Carinhoso e certo na medida exata. José se lembrou da última visita em Madureira. A mãe havia ganhado na paróquia três medalhas. São Rafael, São Gabriel e São Miguel, os três arcanjos.
    – Não vamos nos demorar aqui.
    – Só demos essa passadinha para dizer um “Oi”
    – E para dizer que estamos esperando quando você vai ter a coragem de seguir seus sonhos, meu jovem. O tempo ruge. É. Nosso andar – Rafael complementou Gabriel e o elevador apitou. Quando a porta se abriu, José pode ver uma visão que nunca iria conseguir exprimir a alguém. A imagem, mesmo guardada em sua mente e coração, permanecia sem palavras para definir. O elevador se fechou e abriu no térreo, com uma madame segurando um cachorro em uma bolsa.
    – Andar da piscina. Rápido – A mulher ordenou, mas José saiu do veículo e caminhou até a gerência do RH. Pediu demissão e no mesmo dia mandou seu livro favorito para várias editoras.

  9. E o padeiro morreu…

    “O padeiro morreu. E daí?
    É o assunto do momento, a morte do padeiro, só falam nele agora.
    A morte do padeiro pra cá e a morte do padeiro pra lá
    Eu sou o único que não vê grandes coisas no acontecimento?
    Eu quero mais é que o padeiro se dane!
    Pão ruim daquele, bom mesmo pro capeta amassar.
    Deve de ta lá no inferno fazendo pão pro cão… Padeiro do pão ruim
    Só porque ele morreu o povo usa o fato pra passar o tempo, bando de vagabundos!
    Eu sou sujeito trabalhador, vá falar de morte de padeiro lá pra tua nega!
    Comenta como se fosse surpresa, surpresa? Um cidadão de 96 anos de idade
    Ninguém tem data pra morrer, eu sei, mas ele andava mal há bom tempo.
    Pão ruim pra caramba
    E eu prefiro nem pensar no pão doce…
    Agora que o cara morre esse papo furado, papo furado mesmo.
    Digo e repito antes de dizer novamente, eu não vou ao enterro, não vou.
    Vou fazer o quê no enterro do padeiro? Desejar boa viagem?
    Ta lá no purgatório aprendendo a fazer pão!
    Deixa eu me acalmar, não entenda mal, eu não tenho nada contra padeiro nenhum no mundo.
    Sou contra apenas, e tão somente apenas, o abuso em disseminar o ócio, a inutilidade e a profanação da memória de um idoso por pessoas sem louças para lavar.
    O padeiro vai lançar raios nas cabeças deles!
    Se existe alguma coisa a discutir, e este é um tema que preocupa minha mente trabalhadora desde o fato, é decidir onde compraremos pão agora”

  10. Ele já estava lá quando eu entrei no elevador. O menino estava apontando o dedo do meio para mim. Suas bochechas estavam vermelhas – contrastando com o tom branco de sua pele – e cheias como se estivesse furioso.
    Surpreso com tal atitude, eu virei para a porta tentando não encará-lo. O garoto não aparentava ter mais de doze anos. Eu tinha me decidido por não me dirigir a ele, mas ele fez primeiro.
    – Sabe o que acontece se você se jogar daqui de cima? – Eu me virei para ver do que ele estava falando. Estávamos em um elevador externo do prédio. Era possível ver quase a cidade toda dali.
    – Acho que eu morreria – respondi sem jeito – Você também.
    Ele balançou a cabeça negativamente e seus cabelos perfeitamente loiros e cacheados seguiram o movimento frenético.
    – Os motivos são diferentes. Meu pai é chato. Eu morreria por obediência. Acho que ele se importa mais com você.
    Eu me aproximei da parte de vidro do elevador. Já havíamos subido trinta metros.
    – Desculpe. Eu conheço seu pai?
    O menino me olhou de cima a baixo. Seus olhos eram azuis de uma forma cristalina como eu nunca tinha visto antes. Nesse momento ele me dirigiu um olhar tão serio que parecia que o garotinho de doze tinha se tornado um senhor de setenta.
    – Não sei. Acho que não. As pessoas que dizem que conhecem ele viram idiotas que ficam esfregando frases velhas na cara das pessoas.
    – Tá – Eu realmente tomei por verdade o fato de que eu não fazia ideia do que ele estava falando. – E ele, seu pai está aqui?
    Ele deu de ombros e caminhou pelo elevador. Agora tinha voltado a parecer um garotinho.
    – Dizem que sim. Lá fora também.
    – E sua mãe? – Certo. Eu definitivamente tinha quebrado meu voto de não falar com ele. – Sabe onde ela está? Ela trabalha aqui?
    Um grito de dúvida misturada com incerteza passou pelo rosto do menino. Ele fez uma careta e voltou a parte de onde se podia ver a cidade.
    – O que você tá fazendo aqui? – Eu perguntei.
    – Sei lá só vim ficar longe do meu irmão. O Miguel. Ele é chato. Não me deixa brincar com os meus primos.
    – E eles moram aqui? Digo, os seus primos?
    – Ah. Não eles moram mais para baixo.
    – E para que andar você está indo?
    Ele me dirigiu um olhar traquino como todo garoto de doze anos deveria ter.
    – Lugar nenhum. Primeiro eu vou pra bem alto. – Então seu sorriso se alargou quase como se ele fosse um diabinho. – E depois eu vou lá para baixo. E vou ficar lá.
    Depois de finalmente chegar ao meu andar, eu deixei o garoto sem a formalidade de me despedir, pois achei que não seria relevante para uma criança. E eu nunca mais vi o garoto.

    Titulo: O anjo no elevador

  11. O elevador abriu as portas.
    Ela estava ali, diante dele, talvez o mais perfeito anjo que tivesse cruzado seu caminho. Nunca a tinha visto no prédio.
    – Esse é o elevador mais antigo da cidade inteira – disse a ela (mas queria dizer “Oi, tudo bem?”)
    Ela lançou um olhar meio esquisito pra ele, mas ao fim sorriu.
    – Sério? Ele parece ser bem antigo mesmo! (Tudo bem, e com você?)
    – Sim! Por isso ele é tão devagar! (Qual é o seu nome?)
    – Aaah! Entendi! (Letícia, e o seu?)
    Um silêncio de alguns segundos pairou no ar.
    – Esse também foi o primeiro prédio com mais de quarenta andares da cidade (Cacete, Matheus, o que você tá falando?)
    – Essa eu sabia! (Não, você não sabia. Não precisa impressionar ele, Letícia)
    – Então você gosta de arquitetura? (Você é completamente linda)
    – Adoro! (Não, eu não adoro! E meu, que olhos lindos ele tem. Tou ficando boba)
    – Difícil encontrar alguém que goste! (Você ainda tá falando de arquitetura, chama ela pra tomar um café!)
    – É…. (Por que ele não me chama pra sair? Devo eu chamar? Libertação da mulher, Letícia!)
    Mais um silêncio se instaurou e lentamente o elevador foi parando. Era o andar dele.
    – Bem, te vejo por ai! (Quero te encontrar hoje mesmo!)
    – Também te vejo! (Só vim pra cá hoje almoçar com uma amiga)
    Ele saiu, as portas fecharam. Deixou pra trás um grande amor que jamais foi vivido.

    1. Adorei. Adorei a ideia e o formato e o fato de que você brincou com o conceito do anjo. Mas, olha, dá para colocar mais humor – e não escrachado, mas no sentido de humanizá-los ainda mais – nos trechos entre parênteses. E nem digo no que eles pensam, mas na forma que eles pensam. Faz o seguinte, dá uma lida e considera o seguinte: “eu pensaria isso dessa forma, com essas mesmas palavras, ou de forma muito mais casual e informal?”

      Mas é uma baita crônica, gostei demais.

  12. Arnaud de Oliveira Neto

    Anjo Caído

    Puta que pariu Cláudia! Pra que você foi fazer isso?
    Essa merda de elevador não chega! Será que alguém tá travando ele? Não tem como! Nessa hora não tem ninguém zanzando poraí.
    O cara era um filho da puta! Engomadinho, todo prafrentéx! Mas um verdadeiro filho da puta.
    Eu tinha que ter falado com o porteiro sobre essa luz do corredor! Tá falhando! E do jeito que essa merda de elevador demora eu vou acabar no escuro!
    Qual era o nome de? Jair? Jailson? Sei lá!
    Bom! Agora mesmo que não vou me perturbar com essa merda!
    Bora elevador! Cadê você?
    Eu te amava Claudinha! Por que tu foi fazer isso? E eu nem percebi! O puto chegou cheio de intimidade no mês passado, no bar e eu achando que ele era só simpático.
    Nunca tinha reparado como esse corredor era longo. Essa merda de dor na mão não para!
    Pelo menos eu trouxe o anjinho que te dei no dia que fomos naquele shopping.
    Nunca pensei que você seria capaz de fazer isso. Nunca pensei que EU seria capaz de fazer isso! Mas fiz! E não tem como voltar atrás!
    Sorte que eu peguei vocês de surpresa. Deram mole, não imaginaram que eu ia estar no apartamento essa hora. Mas eu estava! Minha cabaça tava coçando, eu não tava conseguindo trabalhar, deixei o passageiro e vim. Queria era te encontrar, mas o apartamento tava vazio, você não tava lá. Tava quase saindo e vocês chegaram. Abraçadinhos! Porra! Por que eu não maldei?
    Foi reação instantânea! O anjinho tava lá na mesinha perto da porta e a cabeça de vocês ali! Na minha frente.
    Merda! Pingou! Eu tinha que ter limpado essa porra antes. Lavado. Sei lá!
    Essa merda deve estar em manutenção lá em baixo. Vou de escada mesmo. A fresca era você que não gostava de andar eu nunca liguei de descer os sete andares na escada. E essa porra de elevador vive quebrado.
    Não sabia que podia ser rápido assim. Um estalo em cada cabeça, um som de cama velha e os dois caíram. Não gritaram. Um dia alguém vem atrás de mim e eu vou acabar aparecendo naquele programa que tem o cara perneta. Detesto aquele programa. Só fala de desastre. Tá! Eu o que eu fiz foi o que?
    Escada escura!
    Vou colocar logo o anjo na mochila. Acabou!
    Amanha é outro dia e vou te esquecer. Corno nunca!

    1. Puta ideia. Pegou o conceito que passamos e voou longe, parabéns! E a narrativa tá ótima também.

      Mas repito o toque que dei para o Cesar: num texto desses, que são pensamentos quase desordenados, você precisa se preocupar muito com o pensamento em si, tornando o texto o reflexo puro de como alguém pensaria – precisa ser muito, muito natural. Essa precisa ser sua prioridade, mesmo acima do texto ou de gramática ou qualquer outra regra – lembre-se que o texto você pode ajustar depois, na revisão.

      1. Arnaud de Oliveira Neto

        Caramba… muito obrigado Rob! Vou seguir sua dica e fazer uma revisão. Tive um hiato longo longe desta maravilhosa página, por conta da vida mundana, mas estou de volta e colocando os episódios em dia! Um forte abraço e continuem com o trabalho maravilhoso!

  13. Senhores, não tenho o costume de comentar ou interagir em lugar nenhum. Sou um anti-social assumido (rsrsrs), mas tenho o sonho de escrever há muito tempo.
    O trabalho de vocês tem sido uma inspiração e injeção de ânimo sem tamanho. Obrigado.
    Só fico incomodado com o fato de que o trabalho é tão bom que me vi “obrigado” a comentar, interagir, escrever e (incrivelmente) compartilhar o que escrevi.
    Julguem com (ou sem) moderação.
    Grande abraço!!!

    ————————————————————————————————————————————————————————————————-
    O elevador era muito apertado, cabia apenas uma pessoa.
    Parei em frente à porta pantográfica fechada e vi num cantinho uma pequena sacola que continha algo.
    Me senti a pessoa mais corajosa do mundo ao enfrentar a claustrofobia e entrar naquela maldita caixa apertada para pegar a tal sacola.
    Por que cargas d’água eu queria tanto pegá-la?
    Não importa.
    O fato é que quando a peguei, um pó brilhante voou nos meus olhos e caí no sono, pelo menos acho que estou dormindo.
    – Eu estou dormindo?
    Nenhuma resposta veio.
    – Vocês dois tem exatamente a mesma aparência, mas sei que um é um anjo. Achei que anjos fossem mais… angelicais.
    – Eu sou você. – disseram os dois em uníssono.
    A indiferença em seus olhares era perturbadora. Assim como era perturbador o fato de estarem bastante mal arrumados, o anjo e o outro.
    Notei que estava de pé, ainda dentro do elevador e que a porta pantográfica estava novamente fechada.
    Os dois estavam sentados em cadeiras simples do outro lado da porta.
    Ao tocá-la vi que ambos ajeitaram as gravatas que estavam bem tortas. Forcei-a e senti dor. Dor que vi refletida nos rostos semi-barbeados do outro lado da porta.
    – Abra, veja e decida. – Disseram.
    – Onde estamos? Que dor foi essa? Decidir o quê? – perguntei.
    – Abra-se, veja-se, decida-se.
    Ao ouvir a resposta a compreensão veio como um murro.
    Abri a porta a despeito da dor que sentimos.
    Quando dei o primeiro passo em direção ao anjo e ao outro um clarão me cegou e acordei meio tonto.
    Me encarei no espelho do quarto. Preciso me barbear.
    Ajeitei minha gravata e fui ver minha mulher e filha.
    Decidi quem quero ser.

    1. A história é maluca e meio incômoda. Mas eu acho que combina bastante com a ideia que você teve, aumentando progressivamente a sensação de estranhamento da situação. Eu gostei. Gostei especialmente do clima dela.

      1. Obrigado pelo feedback Rob! Significa muito pra mim. Clima foi exatamente a primeira coisa que me veio à mente quando escrevi. Queria algo meio terror/suspense/estranho… Fico muito feliz que tenha gostado. Mais uma vez, parabéns pelo trabalho. Despertou novamente o meu desejo de contar histórias.

  14. Jornal dos Eleitos – Classificados

    Ascensorista – Santo Amaro – Z/S em São Paulo – SP

    ANJOS E DEMÔNIOS LTDA

    Empresa do setor Educação / Transporte, localizada em São Paulo – SP, de porte Grande (acima de 500 funcionários)

    Sobre a vaga

    Salário
    R$ 1.084,00 (Bruto mensal) ou 100 talentos.

    Descrição

    Área e especialização profissional: Serviços Gerais – Ascensorista

    Nível hierárquico: Operacional

    Local de trabalho: Rua Purgatório, n 666 – São Paulo, SP

    Regime de contratação de tipo Efetivo – CLT

    Jornada Parcial noites

    Irá realizar a condução do elevador no transporte de pessoas, anjos, espíritos obsessores e zelar pelo uso do equipamento.

    Horário de trabalho das 17:59hs as 23:59hs de segunda a sexta feira e sábado das 10hs as 16hs

    Exigências

    Escolaridade Mínima: Ensino Fundamental (1º grau)

    Idade Mínima: 40 anos; Tem a mistura exata entre cinismo e otimismo.

    Sexo: Sempre consensual e seguro. ou não.

    Benefícios adicionais

    Auxílio Educação – Temos convênio com os melhores pastores, sacerdotes e satanistas da região;

    Cesta básica – Pão, vinho e cordeiro;

    Seguro de Vida – Cobertura dos planos etéreos, abissais e límbicos;

    Vale-transporte – Networking com os melhores guias.

    Contato: Lúcio ou Miguel, tel: (11) 3366-6633.

  15. Cada episódio mais apaixonado pelo cast. Parabéns!
    Quero agradecer pela oportunidade e desafio de postar um texto aqui e ser lido por vocês. grande abraço!

    O Encontro

    O dia começou como de costume na vida do velho aposentado .
    – Bom dia minha querida. – disse ele dirigindo-se ao porta-retrato ao lado de sua cama, ultimamente era o máximo que podia chamar de companhia.
    Levantou e vestiu-se ao sinal dos primeiros raios de sol que penetraram a janela de seu quarto, e mesmo que tivesse esperanças de um dia diferente não fazia questão que assim fosse.
    – Bom dia companheiro. – Disse ele ao acessorista quando as portas do elevador se abriram no décimo segundo andar para que ele entrasse.
    O velho deixou o prédio residencial e seguiu o conhecido caminho pelo quarteirão, enquanto o acessorista o observava de longe, não competia a um anjo questionar sua missão.
    Como um ser eterno ele aguardou pacientemente a volta do velho aposentado, não era difícil se passar por humano, eles andavam tão distraídos com tantas coisas que não desconfiariam que um anjo pudesse estar entre eles apertando botões de um elevador.
    O velho retornou, satisfeito com o tempo de caminhada desta manhã e ansioso por ler as notícias do jornal que assinara havia pouco tempo, essa coisa de internet era fascinante e mágica para ele,podia se sentar à varanda com seu tablet observando o bairro despertar e ao mesmo tempo acessando informação sem necessidade de folhear o noticiário impresso.
    Adentrou o portão e dirigiu-se ao elevador.
    – Décimo segundo por favor. – A resposta esperada era simples, um clique de botão, um display a contar sequencialmente os andares e então portas abertas para seguir o corredor e chegar ao número 1203 onde passaria o restante do dia.
    O som do clique veio, e o elevador iniciou seu movimento ascendente.
    – Eu vim buscá-lo. – Anunciou o anjo surpreendendo o velho. – Sua hora chegou.
    Uma onda de ansiedade inundou a mente do velho aposentado, era como se ele já soubesse do que se tratava e esperasse por isso, mas se recusasse a aceitar.
    –Eu vou morrer? – Perguntou casualmente, pois a morte não lhe causava medo, esse medo era destinado aos jovens, da mesma forma que o medo do escuro está para as crianças e aos velhos resta o medo da dor.
    –Você já está morto, aconteceu durante a noite e você foi privilegiado com uma morte indolor. Eu sou o anjo da passagem e vim para levá-lo.
    Um clique soou pelo elevador, anunciando a chegada ao andar de destino, mas quando as portas se abriram o velho aposentado não reconheceu o décimo segundo andar, ao invés disso uma lágrima percorreu seu rosto pela surpresa do que lhe esperava do lado de fora do elevador. Ele deu o primeiro passo e os demais se seguiram.
    –Bom dia meu querido. – A velha senhora o saudou e lhe estendeu a mão.
    As portas do elevador se fecharam e no décimo segundo andar um corpo permanecia imóvel expressando um meio sorriso, finalmente o velho aposentado encontrou a verdadeira paz.

    1. Adorei a ideia e o desenvolvimento. Adorei.

      Mas apenas um toque: alguns trechos ganhariam mais força se fossem divididos em frases diferentes, ao invés de uma só. Olha, um exemplo:

      “Levantou e vestiu-se ao sinal dos primeiros raios de sol que penetraram a janela de seu quarto, e mesmo que tivesse esperanças de um dia diferente não fazia questão que assim fosse.” Se você colocar “Levantou e vestiu-se ao sinal dos primeiros raios de sol que penetraram a janela de seu quarto. Mesmo que tivesse esperanças de um dia diferente, não fazia questão que assim fosse.”, você tem as duas ideias – e a segunda é muito importante para seu personagem – muito bem separadas, cada uma com sua própria força. Na mesma frase, elas parecem brigar entre si pela atenção do leitor. Se você usar frases mais curtas, esse texto, que está muito bom, vai ganhar ainda mais força.

  16. Bom dia.

    Excelente cast.

    Muito interessante a jornada do vilão. O que mais me chamou a atenção e não ver o vilão simplesmente como pessoa ou criatura que tem um objetivo e sim um conceito que pode ser trabalhado. O Fábio mostrou isso no filme rush e se não me engano o Rob citou o vilão como uma entidade alienígena que pula de uma pessoa para outra.

    O cast foi uma grande caixa de ferramentas para a construção de um vilão e só de pensar que ele pode ser um conceito, a criatividade começa a se agitar.

    Pensando no cast juntamente com as obras (de todas as mídias) que tenho acompanhado, me veio o seguinte pensamento “porque as pessoas estão cada vez mais se afeiçoando pelo vilão ou o anti-herói?” Será que os vilões atualmente sempre querem a mudança, ou quebram uma estrutura pré-estabelecida ? E atualmente uma boa parcela da sociedade quer essa mudança e não se sente bem na estrutura em que está?

    1. Wesley,

      Obrigado pelos comentários! Sobre sua pergunta, eu acho que é uma série de fatores. O primeiro e mais óbvio é que é mais fácil você enriquecer um vilão ou um anti-herói com conflitos. Aliás, é o contrário: é mais fácil você criar um herói sem conflitos que não seja enfrentar o vilão.

      Mas acho que o motivo mais importante é a sociedade mesmo. Vivemos numa época extremamente cínica e a “bondade pura” não é tão crível quanto “os fins justificam os meios”, dos vilões protagonistas e anti-heróis. Um exemplo parecido foi no cinema dos anos 70, quando os EUA viviam uma crise enorme, com violência nas cidades, polícia corrupta, governos corruptos… Entre os “heróis” da época, especialmente na primeira metade da década, temos um mafioso (Chefão), um assaltante (Um Dia de Cão), um policial extremamente violento (Perseguidor Implacável), um justiceiro (Desejo de Matar). Histórias e personagens normalmente refletem sua época, e não vivemos uma época exatamente bonita.

      1. Muito esclarecedor a sua resposta ao meu comentário. Além de esclarecedor me fez refletir: Como criar um herói além do nice guy? Como criar um herói que vai muito além do deter o vilão? Umas ideias já estão batendo na porta da minha cabeça e estão apressadas. Pensei em algo do tipo “Vou ser um herói, mas tem um preço para eu ser este herói”. Já estou seguindo pela linha do anti-herói.

        Agradeço pela sua atenção e parabéns pelo cast

  17. Carlos correu em direção ao elevador, mas não conseguiria chegar antes dele terminar de se fechar. De repente, uma mão vinda de dentro do elevador segurou a porta. Carlos respirou aliviado e entrou.
    – Obrigado – disse Carlos com as mãos sobre o peito, tentando recuperar o fôlego.
    – De nada – disse o senhor que trajava um impecável terno branco e aparentava estar na casa dos sessenta.
    Carlos apertou o botão do térreo e se recostou na parede.
    – Primeira vez que saio tão tarde e encontro com alguém nesse elevador. O senhor trabalha em qual andar?
    – Estou aqui a trabalho, mas não trabalho aqui – respondeu polidamente o senhor.
    – Ah, sim… Desculpe a minha curiosidade, mas o senhor trabalha com o quê? – perguntou Carlos
    – Viagens – o homem respondeu com um leve sorriso no rosto.
    – Viagens?! Não sabia que tínhamos uma agência de viagens nesse prédio.
    – E não tem. Vim apenas lidar com um cliente.
    – Ah! Então o senhor é um agente de viagens.
    – De certo modo, sim. Mas não descreveria meu cargo dessa maneira.
    – Descreveria como? – disse Carlos tentando controlar a curiosidade
    – Quer mesmo saber? – perguntou o homem. Carlos balançou a cabeça positivamente.
    -Sou um anjo – A expressão divertida no rosto de Carlos sumiu rapidamente.
    – Isso é algo sério demais para se brincar. – retrucou Carlos.
    – Jamais brincaria com coisas envolvendo o Nosso Senhor.
    Carlos olhou para os números do elevador e ainda faltavam alguns andares para o térreo. O senhor voltou a falar:
    – Eu vim te buscar, Carlos. Sua hora finalmente chegou.
    – Primeiramente, eu ainda estou vivo e além disso você não é um anjo. Você é alguém que está debochando de algo muito sério ou então um maluco.
    – Você não poderia estar mais errado. – disse o senhor sem perder a calma – Primeiro, você morreu ao entrar nesse elevador. Seu coração não é mais como antigamente e aquela pequena corrida foi o suficiente para cuidar do resto. Mas relaxe, seu lugar ao lado do Nosso Senhor está garantido.
    – Você só pode ser um louco varrido. Se você é um anjo, me prove. Fale algo que só você saberia.
    – Eu sei, por exemplo, que você expulsou seu filho de casa quando descobriu que ele era gay. – Carlos ficou assustado com a revelação. Sempre escondera a sexualidade do filho da maioria das pessoas a sua volta.
    – Eu tentei ajudar ele. Eu o levei para a nossa igreja como o pastor me orientou, mas ele se recusava a mudar de ideia.
    – Eu sei. Você sempre foi ótimo, jamais duvidando e ouvindo o seu pastor. Não poderia existir alguém mais servil que você. Por essas e outras, você tem um lugar garantido no pós vida.
    – Mesmo? E a minha família? = perguntou Carlos
    – Sua esposa também está quase garantida lá, visto que ela era tão obediente quanto você, enquanto seu filho provavelmente não virá.
    – Ele é um ótimo garoto, mas escolheu viver em pecado. – disse Carlos pesaroso
    O senhor puxou uns papéis de seu bolso enquanto aquiescia.
    – Só vou precisar que você assine aqui para garantir os seus direitos ao lote. – disse o senhor com contrato e caneta estendidos.
    Carlos assinou o papel e o entregou para o anjo. O homem dobrou o contrato e o guardou em seu bolso.
    – Tudo certo! E bem a tempo do fim da descida.
    – Descida?!
    Nesse momento as portas do elevador se abriram e um calor absurdo invadiu o elevador.
    – Para onde você achou que estava indo? – perguntou o senhor em tom de divertimento.
    – Você me enganou! Você disse que era um anjo e me fez assinar aqueles papéis. – protestou Carlos, com uma expressão apavorada ao contemplar a visão fora do elevador.
    – Não houve nenhuma mentira da minha parte. Afinal, um anjo caído ainda é um anjo.
    – Você mentiu para mim. Você falou que estava a mando de Nosso Senhor e eu só assinei os documentos porque você me garantiu isso.
    -Disse que estava a mando de Nosso Senhor e não de Seu Senhor. Você não pode me culpar pelo seu engano.
    – Eu fiz tudo que ele pediu, como pude parar aqui? Tem algum erro nisso. – O suor escorria pelo rosto de Carlos.
    – Não tem erro nenhum. O cara lá de cima pediu basicamente para amar o próximo e você não conseguiu fazer isso nem pelo seu filho. Agora eu tenho um contrato com a sua assinatura que comprova que você tem um lote em seu nome aqui.
    – Eu só assinei porque você me enganou, se você não tivesse feito isso, eu não estaria aqui.
    – Você está aqui justamente por fazer coisas que terceiros mandaram fazer em nome de Deus tão cegamente – disse o senhor enquanto conduzia Carlos, em choque, para fora do elevador.
    A porta do elevador começou a fechar.

    1. Cara, sensacional.

      Você me enganou três vezes. Na morte que vemos e não percebemos, e, principalmente, na identidade do anjo (o lance do Nosso Senhor ficou demais). Na passagem do “seu filho não vai para lá” eu já pensei aqui “porra, como vou comentar um texto preconceituoso desses?” e, algumas linhas abaixo, vi que você estava me dando um baita de um olé! Parabéns!

  18. Buenas Fábio e Rob, muito bom o cast sobre vilões, me fez pensar nos meus vilões e tentar enxergar o arco narrativo que dei a eles, e quase sempre vi que não, não tem arco, e fiquei triste com isso, kkkkkk, ou melhor nem sempre, pois no livro de contos tenho alguns contos que trazem a trama o diabo e suas maquinações na terra dos homens e o por que de tudo que ocorre nos outros contos, porém os “inimigos” ou opositores de cada conto não tem ao certo um arco, ai fiquei confuso, mas assim, no livro que estou escrevendo agora a coisa mudou um pouco de figura e acho que meus vilões ainda podem ter um background a mais, obrigado por isso. Sobre o que se escreve no Wattpad e o final feliz, bom, eu já vi que uma fatia do meu publico que chega e lê o prólogo e não continua é por que não aguenta a violência imposta por mim nas linhas, algumas pessoas já me disseram que é tudo muito violento e que as vezes chegam a ter um pouco de ânsia e que esperavam um mundo menos sujo e mais colorido como na maioria das Fantasias normais, o problema é que eu não consigo e se você ver o prologo tem o quadruplo de leituras que o capitulo 1. Sobre a proposta de escrita, só terminei de ouvir o cast agora a pouco e vou ver se escrevo algo com o que vocês sugeriram e postar aqui, vamos ver o que sai. Abração aos dois, vou seguir para o próximo cast.

  19. Estou achando muito massa. Acabei de ouvir o episódio e mesmo já tendo outro novo, resolvi deixar aqui o exercício. E reparei que, por mais que você queira ser lido, é importante ler os brothers ouvintes do Podcast também. 😉

    CRÔNICA . EXERCÍCIO, PODCAST GENTE QUE ESCREVE. EPISÓDIO 05. ANJO E ELEVADOR.

    Sérgio, correndo pelo corredor, pede para o ascensorista segurar a porta do elevador. Era o seu quinto dia no escritório, situado 29º andar, e não poderia sequer pensar em chegar atrasado:
    _ Vigésimo nono andar – fala sem agradecer a gentileza por ele contemplada à instantes.
    Clovis, o ascensorista, com a cara tediosa que todo ascensorista tem, digita os números no painel do elevador e este inicia a mecânica que lhe cabe. Dois andares depois entram dois senhores, um vestido de anjo e o outro, de demônio. Clovis não esboça nenhuma reação e pergunta qual andar os distintos senhores desejariam ir.
    _ Vigésimo nono andar, por favor! – diz o Anjo.
    Não me contendo por dentro, Sérgio começa a rir enquanto os três o olham com indiferença:
    _ Me desculpem, mas é muito surreal estar com um anjo e um demônio no mesmo elevador que eu! Talvez se eu contar para o pessoal do escritório, eles nem acreditem. Onde arrumaram essa fantasia…
    _ Você não chegará ao escritório hoje, Sérgio. – diz o inimigo de nossas almas.
    _ Espera lá! Estamos debatendo isso ainda. Não resolvemos nada. Acho que ainda tem jeito! Sérgio me diz por que o meu amigo aqui não merece levar a sua alma hoje? – pergunta o anjo.
    _ Quem são vocês? Como sabe o meu nome? E por que você não fala nada? – Pergunta atônito olhando para os dois e tentando chamar a atenção do Clovis.
    _ Ora, Sérgio, se eu sei tudo da sua vida desde quando você nasceu até seus atos de hoje cedo, como não saberia seu nome? Isso é um mero detalhe. Agora preciso que você me ajude. Seu relatório não tem impressionado ao Deus Que Tudo Sabe, e pelo que ouvi em uma conversa rápida, Ele fez pouco caso quando o Aquele Que Você Sabe O Nome requereu para si a tua alma. Eu mesmo estou aqui praticamente como Defensor Público, quando o caso não tem jeito, a condenação vai sair, mas o réu precisa de advogado só para aparecer na foto …
    _ Espera, espera! O quê que eu fiz, pelo amor de Deus? Vamos conversar. É sobre o cachorro que atropelei na faculdade? Ter votado na Dilma na eleição passada? – Pergunta Sérgio interrompendo o Anjo.
    _ Não comentamos sobre política, mas se fosse este o caso, metade do Brasil já estaria na churrasqueira. Então, ainda está frio… – interrompe de forma educada o Demônio.
    _ Mas não é possível! Tenho plena convicção de quem não tenho feito nada de errado para merecer isso. Por favor, confira na lista de vocês. Existe tanto Sérgio por ai. Eu tenho o rosto muito comum, caucasiano…
    _ Sérgio, nascido em 25 de janeiro de 1974. Formado em contabilidade, casado, pai de dois filhos, acabou de começar a trabalhar nesse edifício essa semana, confere? – verifica o Demônio em seu “tablet” infernal.
    O elevador já se encontra em mais da metade do caminho, enquanto Sérgio desmancha-se em desespero, tentando barganhar mais alguns anos sobre a Terra em troca de alguma boa ação que seria reiterada até o seu último dia de vida.
    _ Olha, Deus me mandou um SMS dizendo que tudo bem, você terá mais 15 anos de vida, desde que cumpra o que prometeu e acrescentando mais uma condição. Toda manhã você trará um café para o nosso amigo Clovis. – sentencia o Anjo.
    _ Obrigado! – Clovis agradece sem mudar uma ruga de sua expressão.
    _ Sim, sim! Claro, farei isso com o maior prazer – responde Sérgio ensaiando um sorriso forçado.
    O elevador chega ao andar de destino do Sérgio. Ele despede-se enquanto ouve as ultimas orientações celestiais:
    _ Copo de água em cima da TV não funciona… Olha aí, chegamos ao seu andar. Pode sair! Vai na paz do Patrão – despede-se o Anjo enquanto Sérgio sai em disparada pelo corredor do andar.
    O elevador fecha-se novamente, momento em o ambiente é contagiado pelas gargalhadas dos três que ali estavam.
    _ Como sabe o meu nome? Não me leva! – debocha o Demônio enquanto se apoia nos ombros de Clovis, que por sua vez, tenta puxar o ar para respirar.
    _ Ai, meu Deus! Ele nem reparou que estava de crachá! – observa o Anjo enquanto se engasga de tanto rir.
    _ Se controla, por que a lista do dia é grande – diz o Demônio já ensaiando a carranca para o próximo nome da lista.
    Clovis recebeu café todas as manhãs durante três semanas seguidas, até o Sérgio descobrir que o Anjo se chama Aldair e o Demônio se chama Alcides e os dois trabalham no RH da empresa que o contratou.

    1. Ótima história. É uma boa ideia que não se leva a sério no final, e isso aumenta ainda mais o charme dela. Teve alguns trechos do diálogo que não gostei, mas quando a identidade dos personagens no final foi revelada, acho que encaixou muito bem. Gostei! 🙂

  20. Olá.
    Estou adorando o podcast, comecei a ouvir recentemente e estou curtindo demais.
    Escrever mini contos virou um pequeno hobby meu, mas é algo que faço aleatoriamente.
    Gostei muito da ideia de fazer exercícios com os temas que vocês propuseram. Segue meu conto, mini-conto, historieta.. não sei como chamar.. heheh
    Mandei por email também, pois como estou um pouco atrasado aqui, não sabia se veriam.
    Abraços! = )

    Subindo

    Francisco fazia uma de suas caminhadas noturnas, quando por um momento sentiu estar sonhando. Sentiu flutuar, os pés caminhavam longe do chão. Foi um momento rápido, muito rápido, durou o tempo que as pálpebras cobrem os olhos num piscar, mas foi muito nítido e real. Pensou sobre isso por um momento, intrigado, mas logo decidiu esquecer e terminar a caminhada. O trajeto todo durava uns trinta minutos, o dobro do tempo que o médico havia recomendado. Francisco não gostava do médico, queria mostrar que era mais forte e saudável que todos pensavam.

    Chegava em casa sempre levemente exausto, mas essa noite estava mais esbaforido que o normal. O porteiro do prédio viu e ficou preocupado, mas Francisco foi rude, não achava que precisava de ajuda para caminhar até o elevador. Conseguiu chegar lá com um pouco de esforço, apertou o botão do décimo oitavo andar onde morava e encostou na parede. Nesse momento admitiu para si mesmo que não se sentia bem, talvez devesse ouvir o médico.

    Mantinha os olhos fechados para repousar um pouco e percebeu que havia passado tempo demais, o elevador já devia ter parado. Abriu os olhos e viu que o botão do décimo oitavo piscava sem parar. A tela em cima do painel não mostrava nada, não indicava mais o andar que estava, mas a sensação era nítida, o elevador ainda subia. Por um momento sentiu como aquele piscar de olhos durante a caminhada, sentiu estar em um sonho. Mas logo percebeu que não era sonho, não sabia explicar como, mas sabia, sentia. Então veio o desespero. A velocidade do elevador parecia cada vez maior, Francisco tinha dificuldade em ficar de pé, toda a pressão e força daquele movimento vertical o empurrava para baixo. Pensou estar próximo da velocidade da luz, mas logo em seguida concluiu que isso era tolice, seria impossível. Mas também percebeu que tudo que acontecia ali era impossível, talvez nada disse fosse tolice.

    De repente a luz apagou, mas a velocidade continuava aumentando. Todos os números do painel acendiam aleatória e freneticamente. Isso deixava a iluminação do ambiente muito peculiar. Os pequenos botões de luz amarela davam ao lugar a sensação de uma iluminação de luz de velas e a dança das luzes nos botões davam um movimento extremamente nauseante ao lugar. A sensação de velocidade aliada às luzes que não paravam de se mexer reviraram o estômago de Francisco. O vômito foi bem real, não era tolice. O piscar dos olhos se confundiam com o piscar das luzes, que cada vez ficava mais frenético e assustador. Francisco não conseguia mais distinguir direito o ambiente. Às vezes, quando conseguia perceber algo nos rápidos momentos de luz, percebia o elevador dez vezes maior do que era quando entrou. Às vezes não via nada além do seu nariz, sentia estar dentro de um caixão. Às vezes via no espelho um vulto, uma figura que era assustadora e imponente. O terror que sentiu vendo aquela figura foi algo além de qualquer coisa que já sentiu em toda a sua vida. Quis vomitar novamente mas não conseguiu.

    Quando buscava em suas entranhas uma fuga daquele ambiente hostil, uma luz emanou da figura que viu no espelho. O elevador voltou a se iluminar e parecia muito mais elegante que o elevador original de seu prédio. A sensação de velocidade cessou, e viu que a figura do espelho não estava somente no espelho, estava ao seu lado, brilhando intensamente. Não entendeu como conseguia vê-lo com tanta luz saindo daquele corpo, mas entendeu que luz era a essência daquele ser. Grandes asas brancas e brilhantes abriram de suas costas, e com um olhar gentil para Francisco, estendendo-lhe a mão, disse:

    ‘Chegamos, essa foi sua última viagem nesse elevador!’

  21. Na relação Vilão vs Herói vale a pena citar os os 2 personagens principais de “Death Note”, Raito vs L.

    Raito pra mim é um personagem fantástico. É difícil dizer se ele é vilão ou herói. Como ele mata pessoas, moralmente deveríamos assumir que ele é um vilão. O que acontece é que as pessoas mortas por ele são bandidos logo assumimos que ele é um herói.

    Se você assume que Raito é um herói automaticamente L acaba sendo um vilão e o mesmo acontece ao contrário.

  22. Bem; sou novo nisso. Não tenho o costumo de dar feedback mas… bem segue o texto do “desafio” desde ja peço desculpas por erros. Estou digitando pelo celular.

    Bem aí vai:

    Terça feira, um dia cinza, mais um dia cinza de rotinas e falcidades. Desde que passo pela porta automática do escritório tudo é rotina. Os bons dias cantados e os elogios vazios. As planilhas e os cafezinhos… o dia passa e a rotina é cinza, entediante. Quase dolorosa.

    Enfim o dia passa é hora de ir. Em breve no meu carro a cor vai voltar. Poderei voltar a ter escolhas, e ter supresas. Só mais uma rodada de rotinas. Mais sorrisos vazios. Desejos de Boa noite. O som das portas do elevador enstalando ao abrirem. Até que tudo muda! Tudo ganha cor. Tudo se ilumina!

    Um sorriso; um sorriso verdadeiro me recepciona. Ele compõe um rosto perfeito, com olhos castanhos e pele morena. Quase não tinha retoque com maquiagens, e o que tinha apenas ressaltava sua beleza natural, mas na verdade nem precisava. Esse rosto pefeito é emoldurado por cabelos encaracolados que a deixa com um ar de menina que acabou de descobrir que é mulher. O uniforme padrão da consevadora que administra o prédio não esconde a beleza de seu corpo escultural. E sua voz confirmada o que se via. Era um anjo.

    Ela pergunta é eu respondo com meu melhor sorriso:
    – Térreo por favor.

  23. Curti muito o episódio de hoje. Falar sobre vilões é sempre muito divertido.
    Gostaria de sugerir um podcast sobre o SYD FIELD e suas fórmulas pra escrever roteiros de filmes. Eu tenho uma implicância muito grande com isso porque as pessoas, ao meu ver, acabam ficando reféns dos PLOT POINTS e indicações que ele faz e acabam criando a história em cima daquele formato.
    Como vocês já falaram o que importa é a história e que ela seja boa. Uma vez que você tem isso até acho ok você adequá-la a uma estrutura x ou y. Por exemplo, JOY, do O. Russel. Sabendo da importância de se ter um antagonista, ele criou uma irmã FDP pra Joy que não existiu na vida real. E é uma personagem muito importante, porque cada vez que ela puxa a Joy pra trás (pro fracasso) a gente puxa a Joy pro caminho do sucesso. Palmas pro O. Russel. Todas as fórmulas e teorias que vocês aprenderam vocês consideram fundamentais pro exercício da escrita? Outro dia mesmo o Rob falou sobre uma cara que disse que ia escrever uma trilogia. Porra! O cara não devia nem ter uma página escrita e já estava refém daquilo. Enfim, a ideia é discutir os prós e contras das teorias e fórmulas e afins, principalmente do ponto de vista comercial.

    1. Fabio e Rob, podem ignorar esse meu comentário aí de cima. Vocês já falaram sobre isso no 006. Vocês indicariam algum livro legal com técnicas que possam somar e não virar uma regra a ser seguida?
      To viciado no podcast… Só volto pro scriptnotes quando eu ouvir todos de vocês!

  24. Vinícius Machado Miguel

    Se algo existe no plano do desejo, não está no mundo real; a partir do momento que uma vontade é realizada ela não é mais tão importante e, em pouco tempo, perde a graça. Mesmo os anjos poderiam se cansar da vida que possuíam no céu. Rafael olhava para a terra que o mostrava sua face mais bela. Os grandes oceanos azuis e seus verdes continentes estavam mais interessantes que suas missões celestes: apresentar o paraíso para novatos, rezar ou conviver com seus semelhantes. Toda hierarquia, inclusive a celeste, gerava orgulho; anjos podiam exagerar na sua importância tanto quanto os humanos.
    Enquanto levava um grupo de almas novas, com o desinteresse nascido da rotina, se sentiu um tanto vazio por dentro. Ele avistava as brilhantes nuvens que refletiam, na medida certa, a quantidade de luz para não arder os olhos e as construções, de uma arquitetura única, composta de vitrais e tijolos brancos. Os corais de milhares de vozes possuíam agora o esforço conjunto de compositores como Bach, Vivaldi e Verdi. O perfume vinha da mais deliciosa comida que já tinha experimentado, que era retirado dos frutos do Jardim sagrado de Deus. Ainda assim tudo que conseguia pensar era ir embora. E como conseguiria fazer aquilo?
    O elevador que levava ao reino dos mortais não estava sendo vigiado.
    Seu coração bateu rápido como as asas de um querubim que aprendia a voar. Deixou o grupo de pessoas no lugar onde passariam o resto da eternidade — uma moradia ideal; tão perfeita quanto tudo aquilo que os cercavam. — Rafael sentiu pena deles por alguns momentos, mas eles pareciam felizes ali. Ele também foi um dia; lembrava de quando deixou os males do mundo dos vivos, e quando toda a dor parou de fazer sentido. Mas agora isso era passado. A dor sempre volta, e só pensava em correr até chegar novamente aquele elevador. Passou por toda aquela sufocante beleza das enormes ruas do paraíso, se imaginava novamente entrando nas belas cachoeiras que as pedras machucavam os pés. E, quando lembrou do delicioso cheiro do café que era recompensado por um amargo enganador, teve certeza que precisava voltar naquele mundo.
    Quando se aproximou do portão viu um Anjo jovem — Ismael, o responsável pela defesa daquele elevador — era forte mas não tão experiente na arte da batalha quanto ele. “Vale a pena arriscar tudo pelos meus planos?” se perguntava quando viu o inocente anjo sorrir e cumprimenta-lo pelo nome. Lentamente, sem ter certeza se teria coragem, se aproximou do antigo amigo para dar um abraço. Seus passos traziam dolorosas lembranças. Memórias de tudo que ambos tinham passado naquele lugar perfeito: festas perfeitas, trilhas perfeitas, aventuras perfeitas, pessoas perfeitas e uma existência perfeita. Finalmente estavam perto o suficiente e se abraçaram; e ele decidiu o que faria.
    Era o último abraço de Ismael.
    Quando as mãos dele alcançaram as asas do antigo amigo pelas costas, ele as segurou com firmeza. Era a primeira vez que sangue seria derramado no paraíso. Agarrou com força a base da asa. Apertou até sentir o osso por de baixo das camadas de penas. Puxou com força e velocidade sobre humana. Ismael demorou para entender o que o amigo tinha feito com ele; Rafael se afastou segurando as asas brancas cobertas de sangue em suas mãos. Ele olhou pela última vez para o amigo — Me perdoa Ismael, alguém precisava ser o primeiro. — e com um golpe rápido quebrou o pescoço do antigo anjo.
    Entrou no elevador e se preparou pra descer.
    Entre o vão das portas que se fechavam ele viu o ódio e o desespero. Anjos corriam para impedir sua fuga mas jamais chegariam a tempo. A maior parte dos olhares daquele grupo eram de reprovação mas conseguiu notar um ou dois de esperança; ele havia realizado o sonho de muitos e agora era questão de tempo antes de outros de unirem a ele na terra. O desequilíbrio havia começado. E pela primeira vez em milênios, Rafael considerava o paraíso um local interessante, mas agora jamais poderia entrar novamente.

  25. Peço desculpa pelos erros no texto anterior. Para não perder a inspiração digitei e enviei do Celular.
    Não consegui corrigir o testo então reescrevi, desta vez com um português que não me causa vergonha:

    O Anjo do elevador

    Terça feira, um dia cinza, mais um dia cinza de rotinas e falsidades. Desde que passo pela porta automática do escritório tudo é rotina. Os bons dias cantados e os elogios vazios. As planilhas e os cafezinhos… o dia se arrasta lentamente e a rotina é cinza, entediante. Quase dolorosa.

    Enfim o dia passa é hora de ir. Em breve a cor vai voltar. Poderei voltar a fazer escolhas, e ter supressas. Só mais uma rodada de rotinas. Mais sorrisos vazios. Desejos de Boa noite. O som das portas do elevador estalando ao abrirem. Até que tudo muda! Tudo ganha cor. Tudo se ilumina!

    Um sorriso. Um sorriso verdadeiro me recepciona. Ele compõe um rosto perfeito, com olhos castanhos e pele morena. Quase não tinha retoque com maquiagens, e o que tinha apenas ressaltava sua beleza natural, e na verdade nem precisava. Esse rosto perfeito é emoldurado por cabelos encaracolados que a deixa com um ar de menina que acabou de descobrir que é mulher. O uniforme padrão da conservadora que administra o prédio não esconde a beleza de seu corpo escultural. E sua voz confirmada o que se via: Era um anjo.

    Ela pergunta é eu respondo com meu melhor sorriso:
    – Térreo, por favor.

  26. Mais ou menos 12 segundos por andar

    São Paulo, ano de 2016, sexta-feira, avenida Paulista, um dia aparentemente comum.
    Ela, que ouve muito “Será que chove hoje?”, é ascensorista num edifício comercial bem movimentado, recém contratada e muito feliz com o emprego novo.
    Ele estava ansioso, enfim havia chegado o grande dia.
    Era quase 17h30, horário marcado, e ele ensaiava pela última vez a sua abordagem.
    – Oi, meu nome é Miguel. Não, não. Boa tarde! Como foi o seu dia? Oi! Eu queria… Ah! Ela não vai acreditar, vai rir de mim ou se ela acreditar vai ficar brava ou triste…
    São 15 andares, mais ou menos 12 segundos por andar e isso totaliza 180 segundos fora a entrada e saída das pessoas. Pelo horário é capaz que pare em todos os andares.
    Vamos considerar mais 5 segundos, em média, por andar.
    Ganhando assim mais 75 segundos. Então, no total tenho 255 segundos.
    Praticamente 4 minutos e meio. Se falar depressa, acho que da. Seja o que Deus quiser!
    Começa a aglomeração, é um clima de festa, típico fim de expediente.
    Ao longe Miguel ouve “Bom final de semana” inúmeras vezes. A adrenalina aumenta. Alguém aperta o botão, ele começa a suar frio. Um alarme e as portas se abrem. Lá está ela. Ele respira fundo e quando pensa em tomar coragem, é jogado pela massa para dentro do elevador. Com muito custo ele se ajeita e consegue dizer boa tarde para ela.
    Ela, estampando um belo sorriso no rosto, retribui o cumprimento dele e dos demais e as portas se fecham.
    14° andar e ele:
    – Oi, me chamo Miguel!
    As pessoas começam a se ajeitar no elevador. Ela nem consegue dar atenção para ele.
    Ai começa o zumzumzum…
    – Boa tarde!
    – Nossa, quem escolhe essas músicas?
    – Graças a Deus é sexta!
    Miguel tenta outra vez:
    – Você está gostando de trabalhar aqui?
    Ela: – Sim! Hoje completo um mês.
    Ele: – Eu sei!
    Ela: Como? Nunca te vi por aqui.
    13° andar.
    Miguel acha tudo tão barulhento, todo mundo falando ao mesmo tempo.
    – Dá licença! Dá licença!
    – Boa tarde!
    – Nossa! Tá um calor do inferno aqui (Miguel olha!).
    Ele: É, trabalho, é, mais ou menos (se enrola para explicar e começa a admirá-la).
    Ela se sente incomodada com os olhares.
    12°.
    – Dá um passinho para trás por gentileza!
    – Não cabe mais ninguém!
    11°
    Miguel começa de novo:
    – Como foi o seu dia?
    – Bom.
    Ela acaba com o assunto. Ele sente que está atrapalhando.
    Ele olha fixamente no olho dela e diz:
    – Posso te ver sem óculos?
    Ela fica sem graça.
    Todos olham
    10° andar. Ninguém desce.
    9°. Ela tira os óculos. Ele sorri e diz que o emprego novo retomou o brilho nos olhos dela.
    8°.
    – Cantada barata essa sua!
    Ela solta como um desabafo!
    Ele: Jamais! Sei o quanto você acha invasivo e machista isso.
    (7°) Não sou esse tipo de ser. Mas tenho algo delicado para revelar.
    Um curioso: – Xiii vai dizer que é gay!
    Miguel: Parem de achar que cada revelação diz respeito à sexualidade dos outros.
    Curioso fica sem graça. Miguel continua.
    6°.
    – E se eu fosse gay? O que vocês tem a ver com isso?
    Ela: – Diga!
    5° andar.
    Uma senhora: – Haha, ele vai dizer que votou na Dilma!
    Ele: – Não, minha senhora. Minha questão não é politica.
    A charmosa ascensorista indaga: – O que é, moço?
    Ele: – Estou pagando uma promessa. Tenho pouco tempo, me deixem falar. (4° andar) Eu sou o seu anjo da guarda.
    Todos riem.
    – Não, não é piada. (3°) Eu prometi para Deus que se você conseguisse um emprego, eu viria aqui no horário mais conturbado e te contaria tudo.
    2°.
    Ela ri.
    Ele diz: Por favor, acredita em mim!
    Ela: Como poderia?
    1° andar
    Ele: Na noite antes da entrevista você chorou e disse para Deus que o seu anjo da guarda devia ser um aprendiz. E eu chorei também, chorei porque sou um anjo estagiário, todo atrapalhado.
    Térreo.
    Ela, com os olhos cheios de lágrima, diz:
    – Sinto muito, mas muito muito obrigada. Sobe?

  27. Universo Dicotômico

    No intervalo, logo após o sinal chamar os alunos para fora das salas, Karen corria em direção à antiga ala da escola, soprava a poeira da velha tábua sustentada por dois cavaletes, antes de repousar ali seu livro favorito; coçava o nariz, espirrava duas ou três vezes, deitava-se de bruços com os cotovelos apoiados na mesa e passava seus olhos negros pelo ambiente como se procurasse uma testemunha, antes de mergulhar num mundo de anjos e demônios que a faziam esquecer da própria vida: um pai que bebia, uma mãe que apanhava, um irmão caçula doente e um garoto da escola que não a enxergava.
    Concentrava-se naquele universo dicotômico como um arqueiro se concentra antes de atirar sua flecha, tanto que não reparou quando dois alunos entraram sorrateiros e se esconderam dentro do velho elevador interditado que, em outras épocas, serviu para transportar as roupas das freiras dos quartos do segundo andar para a antiga lavanderia, no subsolo.
    O barulho das grades do elevador se fechando conseguiu trazer Karen de volta; com a testa franzida, estreitou os olhos, tirando os cotovelos da mesa sem respirar e se arrastou para debaixo dela, onde decidiu que ficaria escondida até o sinal tocar.
    Sussurros e gemidos chamaram sua atenção para o elevador. A falta de luminosidade não a favorecia no reconhecimento daquelas figuras que pareciam dançar balé lá dentro, emaranhando mãos, bocas e corpos que se fundiam num só, mas do pouco que conseguia ver, sabia que havia algo familiar numa delas. “Esse cabelo espetado, esse nariz pontudo… não pode ser!”. Arregalou os olhos e colocou as mãos na boca, impedindo-a de gritar.
    Aos amassos sabe-se lá com quem, viu seu anjo Conrado descer do pedestal em que um dia ela própria tinha lhe colocado; aquele ser tão puro, tão casto, tão santo, em questão de segundos, tornara-se um demônio, o mais repugnante dentre todos os livros que ela já havia lido. “Cretino!”, bradou em pensamento.
    Secou o suor que lhe escorria pelas têmporas, sentiu seu rosto ruborizar, fechou as mãos em punho e saiu à procura de Irmã Inácia, diretora da escola, disposta a lavar toda a roupa suja, “afinal não era para isso que servia aquele elevador?” Não demorou muito até encontrá-la e, parando diante dela, quis lhe falar, mas a voz não vinha. Fitava os olhos meigos da freira enquanto esta esperava que a menina falasse alguma coisa. Com os olhos marejados, a única flecha que Karen conseguiu lançar foi: “A senhora já viu um anjo se transformar em demônio?”

  28. olá!
    Muito obrigada pelo cast, estou fazendo a maratona e está sendo muito produtivo, não resisti ao desafio.
    Beijos

    Elevadores, mais um desses males necessários da vida moderna, junto do metro e suas multidões. Do metro tinha conseguido se desvencilhar, morava perto o suficiente para ir a pé ao trabalho, mas o elevador era inevitável.
    Trababalhava no vigésimo quinto andar, alto demais para subir de escada, ainda mais com o sobrepeso virando obesidade, outra consequência da vida moderna.
    Conformado, como quem vai para o abate, entra no elevador aumentando um pouco o volume do podcast, as risadas vindas dos fones abafam a conversa enfadonha das outras pessoas, e começa a tortura. Seu estômago é empurrado para baixo enquanto o elevador acelera, seus pés quase desgrudam do chão quando para.
    Ele fecha os olhos para se concentrar no programa e em suas pálpebras fechadas um rosto lhe sorri.
    Alarmado, olha em volta, as mesmas pessoas de todos os dias estão ali, naquele espaço ridiculamente pequeno do elevador, tendo suas conversas banais ou apenas olhando para as paredes.
    Apesar do coração batendo acelerado, conforma-se de que foi uma ilusão de ótica e volta a fechar os olhos lentamente, e lá está de novo! Vívido, um rosto muito bonito e sorrindo.
    De acordo o elevador vai parando nos andares, as pessoas saem aos poucos, deixando o ambiente menos desesperadamente apertado e menos barulhento, mas não menos opressor.
    Repete a experiência e fecha os olhos, lentamente. Nesse momento só mais dois homens estão no elevador. Com os olhos fechados examina o rosto incrivelmente belo diante de si, não consegue definir o gênero de quem vê, isso unido à estranha aura luminosa só pode significar que se trata de um anjo.
    O elevador para novamente, os dois homens saem, mas dessa vez ele não abre os olhos, encantado com o anjo que lhe estende a mão.
    Aquela presença começa a lhe dar uma profunda calma, quando, com um estalo seco o elvador para e as luzes se apagam.
    O homem olha em volta na escuridão, com o coração batendo na garganta, soca as portas fechadas, apalpa os botões desesperado procurando o botão de emergência enquanto chuta a parede a sua frente, nada reage.
    Nessa completa escuridão o anjo lhe estende a mão, agora já sem medo, ele pega a mão do anjo que lhe sorri.
    E o legista diria que nunca tinha visto alguém morto por infarto sorrindo.

  29. Pingback: Reencontro – O Gaiato Literário

  30. Um pouco atrasado reconheço. Mas nunca é tarde para aprender, ou tentar pelo menos.

    Segue o link do desafio:

    https://gaiatoliterario.wordpress.com/2016/11/18/reencontro/#

    Adorei os podcast, até mesmo os que tem encheção de linguiça. rs rs rs.
    Não acreditei quando em meu primeiro post no blog, um post só para ver com funciona mesmo já recebi um comentário do Fabio Barreto. Já lancei um puta queo pariu! O cara viu meu blog. Agora a responsabilidade é maior.

    No mais um grande abraço. E aguardo novos trabalhos.

  31. Estou adorando todos os podcasts e encantada com tanto conhecimento e tantas dicas. Estou ouvindo todos eles, tentando fazer uma maratona e adorei a ideia do desafio! Aí vi o meu texto do desafio Anjo + Elevador:

    A viagem
    Ele me agarrou e me colocou dentro de um elevador, eu digo elevador pois não tenho outra palavra melhor para descrever. Enquanto eu subia dentro daquele tubo transparente, ele voava ao meu lado com aquelas asas enormes e exuberantes. Eu nunca acreditei em anjos, sempre achei que fossem um mito, mas aquele ser que eu tinha ao lado do meu elevador, me provava justamente o contrário.
    Eu não sabia muito bem como tinha chegado até ali, e muito menos quem era aquele anjo voando ao lado do meu tubo. E porque eu estava dentro do tubo sozinha? Muitas perguntas sem respostas, mas o olhar dele pra mim, com um meio sorriso, me deixava completamente segura e confiante.
    Os seus cabelos negros compridos voavam contra o vento. E suas asas, como eram lindas! Não eram brancas como mostravam tantas imagens que víamos por vários lugares, eram levemente alaranjadas, não em um tom forte, mas um tom suave, quase pastel, um tom que inspirava alegria e calor.
    A visão lá de cima era impressionante, no início ainda conseguia ver a cidade através do chão transparente, cidade que foi aos poucos ficando tão pequenina até um ponto em que não conseguia ver mais nada. E no horizonte consegui ver de um lado o sol se pondo e o céu pintado com cores quente e lindas. As asas do anjo pareciam combinar com aquele cenário.
    Não sei quanto tempo a viagem durou, mas durante todo o tempo ele não parecia desgrudar os olhos de mim, parece que queria ter certeza que eu não fugiria. Nem acho que isso era possível, o meu elevador parecia não ter portas.
    Eu tentava em meus pensamentos formular possibilidades daquilo estar acontecendo comigo, o que eu teria de especial? Pra onde ele estaria me levando? Qual a finalidade disso tudo? Com essas perguntas em minha mente o sorriso dele parecia ter aumentado, parecia até que estava achando engraçado o fato de eu estar tão confusa. Mas será que ele consegue ouvir meus pensamentos? Se consegue por que ainda não me explicou tudo?
    – Aonde está me levando?
    Tentei em vão me comunicar com ele, que continuou me olhando com olhar sereno e o meio sorriso que não saia do seu rosto. Comecei a me perguntar se esse sorriso era por simpatia ou hipocrisia. Mas algo me dizia que ele era bom, não só pelas asas, mas parecia que eu já o conhecia antes. Será de algum sonho?
    Resolvi olhar pra cima e percebi que parecíamos estar chegando em algum lugar. Não sei definir muito bem o que via, pareciam nuvens, mas ao mesmo tempo parecia chão. Achei que iria bater naquela massa, mas no momento em que o meu elevador encostou na nuven-chão um buraco se abriu e meu elevador de repente ficou opaco e parou em um solavanco.
    Foram alguns segundos somente, mas o desespero tomou conta de mim. Eu não via mais o meu anjo, sim já me apossei dele. Seu meio sorriso que me acompanhou por essa viagem estranha e completamente sem sentido se fora por detrás desse vidro agora leitoso. E uma porta que antes eu não via se abriu em um clarão alaranjado, como as assas do meu anjo, e tomaram conta de tudo, dentro e fora do meu elevador e então eu não pude ver nada.

    1. Olá, tudo bem?

      A ideia é que seu texto seja publicado em algum lugar e que só o link venha para cá. Pode publicar e fazer isso, por gentileza? Eu removo textos copiados e colados até para manter tudo organizado e, especialmente, para incentivar você a publicar!

      Um abraço,
      Fábio

Comentários encerrados.

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