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McG e Christian Bale assumem a responsabilidade de reativar a franquia criada por James Cameron, ao mostrar o confronto entre resistência humana e exterminadores da Skynet. O Exterminador do Futuro: A Salvação chega aos cinemas cheio de segredos, promessas e um debate sobre a essência da Humanidade.

Por Fábio M. Barreto
Correspondente em Los Angeles

Uma versão resumida dessa matéria foi publicada originalmente no Jornal do Brasil, na Capa do Caderno B, na última sexta-feira, dia 5 de junho de 2009. Foi minha estréia no JB, o que me deixou bastante feliz. Confiram o texto!

O Exterminador do Futuro: A Salvação (leia crítica oficial do SOS Hollywood aqui) tem um hype diferente. O filme mais arriscado da carreira de McG está na mira de um público especial: saem os internautas alucinados, entram os próprios atores e diretores de Hollywood. Ao lado do irresistível Star Trek, o novo capítulo na vida de John Connor, interpretado por Christian Bale, era o mais esperado pela classe, com declarações descaradas de gente como J.J. Abrams, Sam Raimi e Vin Diesel. Também pudera, o argumento de McG, e roteiro de Jonathan Nolan [não-creditado], mostra o episódio mais empolgante da luta contra a Skynet – a resistência humana.

Os riscos são grandes e McG sabe disso, tanto que esperou até o último momento para finalizar o longa-metragem, ou seja, começo de maio – pouco menos de 15 dias antes da estréia mundial, no dia 21, mas esperamos até o último segundo para assistir ao filme. Mas isso não o impediu de ficar passeando com uma cópia bruta durante a divulgação do filme em Los Angeles, quando tive acesso a algumas cenas inacabadas e comentadas pessoalmente pelo próprio diretor; mas muita coisa mudou. A participação de Arnold Schwarzenegger [sim, ele está lá], por exemplo, foi anunciada cerca de 2 semanas antes do término da edição. Esse é o estilo movimentado e em constante aprimoramento de McG, cuja dinâmica dos comerciais ainda dita muito do seu jeito eloqüente e certeiro de falar.

Não há dúvidas de que ele tem certeza sobre seu filme. Decorou cada linha dos dois primeiros filmes “seus guias para a Salvação”, foi pedir a benção para James Cameron [que se reservou ao direito de não gostar do filme, sem dar seu aval] conversa sobre qualquer aspecto da obra sem titubear e, diferente do discurso pronto de Hollywood, sabe dos riscos e de sua “fama”. “Entrei nessa com o seguinte pensamento: mostrar a ascensão de John Connor e, obrigatoriamente, Christian Bale deveria interpretar o personagem. Era ele ou nada”, define McG. “Ele [Bale] usa seu corpo como poucos na atualidade; ele respira, pisca ou fala do modo como deseja, ele controla tudo, exatamente como seus personagens pedem”. Tamanha era a dedicação de McG ao ter seu astro, que viajou a Londres para apresentar o conceito, ouviu um não, retrabalhou a história e chegou a uma versão que agradasse ao ator.

Mesmo assim, não mudou suas convicções sobre a trama. “Tinha tudo muito claro, na verdade, imaginava esse filme acontecendo na minha cabeça, então foi uma questão de encontrarmos formatos mais efetivos para cada cena, mesmo depois que Christian já estava confirmado”, explica. De acordo com o diretor, Bale disse que só faria esse filme caso ele pudesse ser lido por dois atores, frente a frente, sem necessidade de nenhuma explosão ou efeito. Se essa era a condição, e ele concordou, o aspecto dramático estava garantido. Tanto que, embora pontual e impactante, grandes explosões ou efeitos são secundários em Salvação. “Garanto que se Christian tivesse agido por puro ego ou estrelismo, não haveria o personagem de Sam Worthington. Antes de mais nada, ele é um artista e pode colaborar positivamente para seus filmes, então, todos ganham”, justifica.

Aliás, a presença de Worthington chega a eclipsar até mesmo a figura famosa de Bale. São dele os melhores momentos em cena e é em torno de seu personagem que a grande discussão se forma: qual o significado de ser humano? É o assassino Marcus Wright [um ciborgue cuja história revelará a gênese do T-800] quem busca redenção, ou salvação, ao morrer em 2003 e acordar em 2018, em meio à guerra. Salvação insiste em lembrar o público de máquinas são insensíveis, seja pelo fato de não enterrarem seus mortos, enquanto humanos se ajudam, mesmo em meio à miséria. Marcus tem alma humana e corpo de máquina. As linhas se misturam e, mais uma vez, John precisa escolher se confia, ou não, numa máquina.

Embora seja um homem de muitas palavras, McG prefere que seu filme fale por conta própria, por isso, sem que a Sony soubesse, chamou um pequeno grupo de jornalistas para uma salinha dentro do hotel em Beverly Hills para mostrar duas cenas: a abertura e a convocação de John Connor para o restante da resistência.

Na cena inicial, nada de batalhas, um diálogo intenso e melancólico entre Helena Bonham Carter e Sam Worthington acontece dentro de uma prisão em 2003, onde um beijo sela o destino da raça humana; na outra seqüência, Bale encara cerca de 3 minutos de cena sem edição, enquanto segura um microfone e clama pela ajuda dos demais membros da resistência. É uma aula de entonação e controle de voz, sem errar nenhuma palavra e como se estivesse acabado de correr a Maratona de Nova Iorque tamanha impressão de cansaço. Beira o brilhantismo, mas seu efeito foi reduzido posteriormente por conta da edição.

A intensidade também causa efeitos colaterais e um deles foi o famoso surto explosivo de Bale. Ele berrou a plenos pulmões contra o diretor de fotografia que ficou andando atrás do set durante as filmagens e “distraiu” o astro. A gravação de som se tornou hit na internet e, semanas depois, Bale ligou pessoalmente para uma rádio de Los Angeles, pediu desculpas no ar e disse que tudo estava resolvido entre ele e o andarilho.

Excetuando-se a forte atuação de Bale, o resto era incerto no roteiro de Salvação, que rumava para um adiamento por conta da greve dos roteiristas. Porém, foi o próprio Bale quem convidou Jonathan Nolan para trabalhar numa nova versão [a Writers Guild of America não permitiu seu crédito, por ter trabalhado em cima da versão “oficial” de John Brancato e Michael Ferris, os responsáveis pelas bobagens no terceiro filme], que ficou pronta rigorosamente horas antes da greve começar. “Nolan praticamente reescreveu todas as cenas durante as filmagens, essa vitória é dele também”, elogia McG, que, ciente da besteira que fez ao manter os roteiristas anteriores, pouco pode fazer quando Bale sugeriu o convite ao roteirista de Batman – Cavaleiro das Trevas.

Muito segredo, rumores sobre as participações de Linda Hamilton e Arnold Schwarzenegger e informações propositalmente conflitantes; a batalha decisiva entre os restos da resistência das Forças Armadas – comandadas pelo veterano Michael Ironside – e a Skynet; e o desenvolvimento do T-800, modelo de exterminador do Governator, cujas pesquisas envolvem a captura de milhares de seres humanos para testes de pele sintética e outras características do assassino cibernético. Em período tenso na Califórnia, o governador Schwarzenegger aceitou participar, contanto que não precisasse filmar nada. A solução foi utilizar imagens de arquivo e recriar o personagem numa cena que ficou guardada às sete chaves – e arranca palmas da platéia. Linda, por sua vez, gravou diversas mensagens de Sarah para John, que serão ouvidas em fitas cassete. Duas foram utilizadas no corte final. O cachê foi alto.

Salvação assume tanto sua vertente de road movie social, que uma das obras recomendadas por McG para seu elenco foi “A Estrada” [Alfaguara, R$ 33,90], incômodo romance pós-apocalíptico de Cormac McCarthy. O arco de Kyle Reese foi deverás influenciado por esse material, seja em sua “resistência” quase solitária numa Los Angeles devastada, ou em seu árduo caminho para procurar John Connor. Tudo é sujo, caótico e assustadoramente abandonado, mas nada da escuridão tomada por crânios, muito menos as modernices da série The Sarah Connor Chronicles, acertadamente, ignorada pela nova história que, aliás, também descartou os acontecimentos do terceiro filme. Outra sugestão de leitura do “O Caçador de Andróides” [Rocco, R$ 36,50], de Philip K. Dick, mas nem todos leram, especialmente Bale.

John Connor é o personagem da ação; Marcus Wright responde pela maior parte do drama. Meio-humano, meio-máquina, suas decisões e motivações colocam em xeque os conceitos de Humanidade nesse futuro incerto. Os humanos atacam, mas a Skynet vence a luta. Qual atitude tomar quando a diferença entre homens e máquinas acaba? Marcus é essencialmente humano, mas desperta o pior na resistência ao descobrir sua natureza cibernética [seu corpo é doado para a Cyberdine depois do cumprimento de sua pena de morte]. É justamente nesse subtexto social que está uma das maiores forças de Salvação.

“Esse filme não é meu, é dos fãs. Existe um sentimento de propriedade em torno dessa franquia, então meu trabalho é tomar decisões que honrem os verdadeiros donos da bola”, brinca McG, que pensou em convocar Thom Yorke [do Radiohead] ou o argentino Gustavo Santaolalla [Diários de Motocicleta; O Segredo de Brokeback Mountain] para compor a trilha sonora, mas acabou se decidindo por Danny Elfman. “Danny mora numa mansão de filmes de terror, falando sério (risos). A trilha certa precisa reforçar o objetivo visual, que envolveu pesquisas em lugares onde explosões nucleares realmente aconteceram como Chernobyl, por exemplo; queimamos um pouco os rolos utilizados para ganhar uma tonalidade mais amarelada, e crua, como se o próprio material tivesse passado pelo apocalipse nuclear.

De acordo com McG, o fundamental em Salvação está no fato de não se tratar de “O Exterminador do Futuro 4”, mas sim de um novo estilo narrativo dentro desse universo. Objetivo que ele cumpre bem, aliás. Em outras palavras, assim como John Lasseter diz dentro da Disney, ele reimaginou a criação de Cameron. “O material original é homenageado e honrado, mas dentro de um novo modo de se contar essa história. Quebramos a repetição ‘exterminador volta para matar um dos Connor, alvo luta para escapar e mata exterminador’. Agora não há espaço para isso, vemos um Connor soldado, obedecendo ordens, se construindo e, acima de tudo, tomando seu lugar no momento certo”, argumenta o diretor. John está na ofensiva, e, a seu modo, no comando da situação. Sem dúvida, uma nova dinâmica.

É nesse ermo futurista que encontramos a peça que falta em Salvação: Kyle Reese. Anton Yelchin é jovem, mas entende de cinema. Estuda cada aspecto e se vê diante de seu grande momento: apareceu pouco, mas marcou presença em Star Trek, como Chekov; e agora divide a tela com Christian Bale, pois as histórias dos personagens seguem paralelas até o final. Reese é capturado pela Skynet e, para garantir o futuro, é para lá que John deve seguir, numa das maiores batalhas da série. O resultado é um mano-a-mano ensandecido, com direito a um rosto familiar e a revelação dos planos das máquinas.

O Reese de Michael Biehn é ícone dos bons moços, o paladino do futuro, mas ainda é um adolescente em Salvação. “Reese precisa se tornar aquele sujeito do primeiro filme e não pode simplesmente receber a missão de bandeja. Depois de tudo que passa, aquele indivíduo surge disposto a tudo para salvar a Humanidade; e é isso que ele vai mostrar”, comenta McG, claramente orgulhoso do trabalho de Yelchin. E o jovem ator, que impressionou a produção por sua atuação em Alpha Dog, completa: “Ele cresceu naquela realidade impiedosa, então há muita raiva nele, com direito a momentos de explosão e frustração, mas, ao mesmo tempo, está no caminho para encontrar as bases daquele herói que salva Sarah Connor”.

Se recriar um personagem famoso pareceu não ser problema para Yelchin, conhecer James Cameron foi uma experiência diferente. Aproveitando a ligação temática com o criador da série, e a amizade com Sam Worthington [ator principal de Avatar], ele visitou o set e conta como foi: “Cameron me intimidou um pouco, logo de cara veio perguntando ‘o que você quer fazer com esse personagem?’, e demorei para reagir, mas Sam estava perto e notei que não era nada agressivo, mas curiosidade mesmo. Depois disso, ele me mostrou o set de filmagens e fiquei babando por tudo aquilo. A única coisa que consegui dizer foi ‘muito obrigado por criar tudo isso’”.

Com um elemento social forte, a ação também precisa de espaço para construir o ritmo do filme e preparar o confronto entre John Connor e a Skynet. Batalhas aéreas, em rios e até mesmo nos oceanos tendem a mostrar a complexidade da luta contra as máquinas. Kyle Reese é perseguido, e capturado, por um Harvaster [robô dedicado a capturar humanos para as pesquisas do T-800]; enquanto membros da Resistência pilotam A-10 Thunderbolts [antitanque] e para tentar abater as unidades aéreas da Skynet. “O objetivo é ser o mais amplo possível, mostrando o poder de adaptação da Skynet e todo o esforço humano para não se render, mas, claro, estamos perdendo a briga”, define o diretor. A unidade mais usada pelas máquinas, porém, é o T-600, “desajeitado, com pele sintética e facilmente identificável”.

O Exterminador do Futuro: A Salvação é dirigido por McG, mas deveria ter co-autoria de Christian Bale, cuja presença salvou o projeto da alcunha de bomba anunciada para um dos mais esperados da temporada. Felizmente, a produção foi bem sucedida na tarefa de manter seus segredos e garante a experiência cinematográfica onde ela deve acontecer, no cinema.

Mesmo cumprindo seu prognóstico positivo, o resultado fica aquém da grandiosidade anunciada por McG. O filme faz jus aos dois primeiros longas [que são mencionados a todo momento, com frases e situações], merece ser assistido, mas ficou indeciso entre debater a Humanidade ou assumir a ação como linha guia. Parte disso é culpa do excesso de zelo do diretor. É perfeito como nova peça na mitologia da série. Realmente perfeito. Mas o senso de novidade acontece em pouquíssimos momentos, como nas cenas do comando da resistência ou na infiltração da Skynet. John Connor apenas cumpre o que se espera dele, sem grandes repentes de inovação.

Tecnicamente, é uma grande realização. O fato de todos os exterminadores terem sido feitos pelo pessoal de Stan Winston – homenageado logo após o término da projeção – garante aquele senso de realidade que se perdeu por conta do excesso de CGI, como no caso dos novos Guerra nas Estrelas, por exemplo. Mas sem muito arrojo. McG sabe dos riscos e fez apostas seguras. Não compromete.

O filme aposta na salvação bíblica e messiânica, assim como seu diretor: “Skynet não entende o conceito de sacrifício; seja o de Sarah Connor por seu filho, seja o de Kyle Reese pela causa, já que ele sabia que nunca mais voltaria para seu tempo, por isso a salvação é possível”, concluí McG, cuja própria salvação pode acontecer no confronto entre humanos e máquinas. Na maior de todas as guerras, cujo elemento principal é Sam Worthington.

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Fábio M. Barreto

Fábio M. Barreto novelista de ficção, roteirista e diretor de cinema e TV. Atuou como criador de conteúdo multimídia, mentor literário e é escritor premiado e com vários bestsellers na Amazon. Criador do podcast "Gente Que Escreve" e da plataforma EscrevaSuaHistoria.net.
Atualmente, vive em Brasília com a família.

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