Perigo: Não Alimente os Jornalistas

A função deles é perguntar, articular, explicar e comunicar. Mas espere quase tudo menos isso de jornalistas espalhados pelo mundo. Muitos deles, incluindo alguns editores brasileiros metidos a celebridade, são perigosamente… despreparados e tapados!

Ao longo de 12 anos de profissão, parte deles dedicados a organização de eventos para imprensa e condução de entrevistas, posso dizer com tranqüilidade que o jornalista brasileiro é um dos melhores quando o assunto é perguntar, mas quando é ruim, sai de baixo. Entretanto, nem o piorzinho dos nossos se compara à média de jornalistas norte-americanos e, especialmente, os demais estrangeiros baseados aqui em Los Angeles. É triste, mas, pelo jeito, os fofoqueiros profissionais do mundo estão em baixa e, com isso, o trabalho sério é cada vez menos valorizado, enquanto matérias fúteis e perguntas imbecis reinam soberamas no mundinho da imprensa.

Uma historinha antes: Quando Samuel L. Jackson foi ao Brasil para lançar o filme Conduta de Risco, durante o Festival de Cinema do Rio de Janeiro, eu trabalhava para a Fox Film e controlei a coletiva de imprensa que o ator concedeu em plena praia de Copacabana. Certo momento, o microfone foi parar nas mãos de uma garota que se levantou, sacou um pedaço de papel amassado do bolso e leu algo – teoricamente em inglês – que ninguém entendeu absolutamente nada.

Ignorando o mico que a cidadã pagou, passei os dias seguintes pensando o que a organização do Festival tinha cabeça para credenciar uma pessoa, sem idade para ser formada – claramente – para eventos importantes como aquele. Fácil: sou jornalista, escrevo para o blog tal ou para o jornal da PUC-RJ, qualquer coisa que o valha. Depois eu descobri que um cara levou a menina, pois ela “sabia falar inglês” e seria ótima para fazer a pergunta. Parabéns, sua anta! Tinha tradutor simultâneo, não precisava levar uma interprete inexperiente e nervosa. A menina ficou bamba, claro, na frente de um ator, de pé, com meio mundo olhando. Tadinha, pagou mico e levou a toda a classe junto!

A razão dessa historinha é simplesmente exemplificar que podemos ser imbecis e expor a profissão ao ridículo das mais diversas formas possíveis. Claro, as engraçadas ninguém tenta, sempre tem que ser humilhante e vexatório. Enfim, o que nos trás a Los Angeles, em meio à jornada barretônica em direção aos maiores e melhores astros da atualidade. Ainda não participei de muitas coletivas de imprensa, propriamente ditas – ainda bem, depois você vai entender! –, mas as mesas redondas são constantes, mesmo eu sempre tendo entrevistas individuais com os atores depois.

Nas poucas coletivas, não existe o microfone como no Brasil, cada um disputa no grito a chance de fazer as perguntas. É engraçado ouvir as gravações depois e ver a quantidade de vozes tentando atrair a atenção do ator em questão. Entretanto, na última entrevista, cerca de 40 jornalistas participaram e, no máximo, 8 fizeram perguntas. Eu, claro, fui um deles. Na verdade, depois de ler tudo isso, você vai entender a razão de eu querer perguntar tanto e não deixar espaço para os outros “profissionais”. Chega a ser irritante ver um sujeito que voou 18 horas da Europa para Los Angeles para perguntar algo como “gostou do carro que dirigiu no filme”. E ponto. Viagem da Europa, hotel de primeira classe, três noites, tudo pago, e pergunta isso? Meio infrutífero. E as assessorias parecem não se importar, especialmente as grandes.

Primeiramente, é preciso deixar claro que todo mundo recebe um pressbook – calhamaço que salva a vida de quem não vê o filme, cheio de sinopses, entrevistas, comentários até do cabo bem da segunda unidade que filmou cenas externas do céu -, ou seja, mesmo para os mais tapados, informação não falta. É só pegar alguma coisa dali, mudar a ordem e perguntar.

A regra da democracia é o que vale. Cada um chega com sua pauta, tem algo a conseguir para cumprir a tarefa do editor e exige-se respeito entre os colegas. Tudo perfeito. Começam as perguntas e alguém sempre abre a série achando que está sendo super amigável e simpático. E é, invariavelmente, um desses assuntos:

– Empolgado por ser pai/mãe novamente?
– O que te atraiu ao projeto?
– O que você faz no tempo livre entre filmagens?

Falta aparecer um luminoso na testa do sujeito: De novo isso?

As perguntas começam a rolar e, lá no meio, alguém resolve soltar outra pérola:
– Que músicas você tem no seu Ipod?
– Qual o último museu que você visitou?

PELOAMORDEYODA, quem em sã consciência quer saber disso? Nem as leitoras das revistas de esportes radicais femininos se interessam por isso. Mudaria a sua vida, amigo leitor, se soubesse que, sei lá, Angelina Jolie foi visitar uma exposição obscura de arte africana na Antuérpia? Ou que Hugh Laurie escuta Beatles no Ipod? Isso gera, quando muito, uma informação circunstancial na matéria. E olhe lá.

Chega a ser embaraçoso notar que, por mais específicas que sejam as pautas, as pessoas não ligam muito para o filme em questão e para o que o ator – que vai dedicar os próximos 20 minutos da vida dele a responder às aqueles jornalistas – possa realmente contribuir. Levou pouco tempo para notar que são poucos os correspondentes que efetivamente trabalham com cinema e suas características. A maioria do pessoal é de revista feminina, revista de fofoca internacional e, mesmo as “vacas sagradas” dos grandes jornais europeus se mostram verdadeiras antas se comparados ao tipo de pergunta que os brasileiros fazem. Por isso, tudo parece importante, menos o filme, que acaba servindo como desculpa para explorar a vida pessoal das celebridades e, no processo, arrancar alguma declaração bombástica sobre uma casa nova ou afiliação política.

De maneira alguma estou puxando a sardinha para o meu lado, embora fazer boas perguntas seja obrigatório no meu trabalho e exigido por meus editores. Mas, falando em termos de junkets no Brasil, os atores e diretores sempre são bem explorados, falam sobre diversos assuntos. Tudo reflexo de gente que se prepara e, talvez pela escassez de oportunidades, faça de tudo para aproveitar a chance ao máximo. Ou, simplesmente, pois somos jornalistas melhores mesmo.

A Larissa, com quem trabalhei por anos no Cartoon Network, sempre dizia que os brasileiros davam um baile no resto do povo da América Latina. E vi que isso era verdade quando moderava entrevistas para o Cartoon e para a TNT. Agora, notei que, quando tem brasileiro na mesa, a gente só perde para as folgadas que querem ficar perguntando de vida pessoal, repercussão de coisas que outros famosos falaram sobre aquele famoso ou quando tem alguém “grávido”.

Claro, tudo pode piorar quando a pessoa que é enviada para cobrir o evento arranha no inglês. Para ilustrar o fato quase folclórico, cito uma colega que veio da Espanha por uma revista teen. No carro que nos levou ao cinema – eu continuo pegando até os hotéis e aproveitando a carona da van até o cinema, quando é muito longe – já deu para perceber que a moça faltava assumir que tinha medo de falar inglês. Bom, sem galho, o filme era musical, então não tinha muito o que entender mesmo, era só sacar o refrão da música e tudo bem. Detalhe, ela ficou 4 horas presa na imigração, pois disse que tinha viajado a trabalho, mas tinha visto de turismo, entretanto, ela estava aqui como jornalista. Bela comunicação, não?

Chegou a hora da entrevista, qual a minha surpresa quando notei que a moça ficou o tempo todo calada e, quando resolveu abrir a boca, perguntou (atenção para a pronúncia impecável): is iti impórtanti to bi iórsélufi?

O entrevistado em questão ficou com cara de “Ah?”, notou o pânico na cara da criatura e respondeu qualquer coisa. Pois é, quando se faz uma pergunta só para marcar presença é isso que se consegue. Resposta boba e pronta. Depois, quem leva a fama de que só repete as mesmas coisas são os atores, isso quando não são tratados como “babacas”. O Harrison Ford tem essa fama, mas foi fantástico na uma hora que o entrevistei. “Babacas” são esses caras que querem polemizar e perguntar bobagem, aí levam uma resposta atravessada e descem a porrada na pessoal, no filme, no contra-regra, e até a última geração de periquitos amestrados da Islândia do office-boy que levou o roteiro da copiadora até o estúdio!

Para fechar, o exemplo máximo:

Fulano falava sobre um filme ligado ao budismo.

– [Repórter Masoquista #1] Você se tornou budista?
– Não.

-[Repórter Masoquista #2] Quais conceitos do budismo você adotou para a sua vida?
– Acabei de dizer aqui, não sou budista.

– [Repórter Masoquista #1… de novo] Mas o budismo é baseado no bom senso.
– E eu uso o meu bom senso, mas não sou budista. Não ficou claro? [faltou levantar, pegar a cadeira e jogar na cabeça dos imbecis].

Será tão difícil assim aceitar um “não” como resposta? Pelo jeito é.

Como já diz o ditado, perguntas idiotas, respostas cretinas. Enquanto isso, eu já sei dos gostos pessoais de um bando de gente famosa. Nossa, minha vida mudou!

20 comentários em “Perigo: Não Alimente os Jornalistas”

  1. Adorei o post!
    Eu me lembro da coletiva com o Vigo em que as perguntas foram excelentes e só no finzinho aquele sujeito da playboy levantou para perguntar o que ele achava das mulheres brasileiras. Todo mundo ficou indignado porque estava claro que o cara não tinha nada para fazer ali. Até o Vigo ficou sem graça.
    Melhorou? Aí tem uma aspirina que se chama Body & Back Pain, é uma maravilha para gripe, eu só uso essa em casa, tenho estoque ^_^
    Beijão, se cuida
    Beijo

  2. Ótimo post.
    Verdade, nada é mais irritante do que essa mania de perguntas imbecis sobre vida pessoal, ginastica, dieta, casa, carro… e o filme q é bom, NADA!!

  3. Sempre que passo pelo Judão venho aqui ler o SOS Hollywood, mas nunca tive a intenção de comentar, talvez, por não ter tido nada de muito relevante a dizer. Esse post, no entanto, me despertou o interesse justamente pelo absurdo e por tocar em um ponto que, para mim, é cada vez mais preocupante: a banalização do jornalismo. Nesse mundo de celebridades e de pautas absurdas (muito alimentadas pela Internet e pela necessidade de colocar o máximo de “informações” e “notícias” por dia), o jornalismo tem se confundido com a fofoca e as baboseiras diárias. Impressionante (ou talvez nem tão impressionante assim) é como, pelo relato do Barreto, a mídia internacional, muitas vezes tomada como padrão por nós, sempre auto-depreciativos, brasileiros, é capaz de tantas perguntas inúteis. Fiquei realmente satisfeito com o relato porque foi bom, para mim, ter uma idéia de como as coisas acontecem. Sou um mero estudante do 4 semestre de jornalismo e este nicho do entretenimento/cinema/música/etc é o que mais me interessa no jornalismo. Infelizmente, como residente de Salvador, as oportunidades para contato com esses tipos de evento e publicação é quase nulo. Mas, ainda assim, muito bom conhecer esses bastidores. Continue assim, Barretão (quanta intimidade) expondo criticamente essas bablelas do mundo jornalístico.

  4. Hahaha!
    Sempre, sempre na coletiva de imprensa de um filme Harry Potter alguém pergunta “Você tá saindo com a Emma Watson?”.

    Falta de criatividade ou de inspiração pra perguntar algo decente. Detalhe que na coletiva em Londres, do último filme, enquanto Daniel Radcliffe falava de sua vida pra uma repórter lá, Emma Watson “olhava admirada” o teto do lugar, durante um grande tempo… A pergunta devia ser tão desinteressante, que ela ficou apenas “olhando” o teto…

  5. impecável! é exatamente o que penso em relação a certos ‘chiliques’ que se ouve em entrevistas ou qualquer evento em que se necessite interargir com o entrevistado em tempo real!
    o pior é ouvir camarada falar com o entrevistado(a) como se fosse o melhor amigo(a) dele! cheio de intimidades e tals!
    ótimo post, parabéns!

  6. Muito legal esse post, Barretão! Realmente, a qualidade dos profissionais de imprensa na área do entretenimento só tá caindo. Eu arrisco dizer que é consequência do crescimento da maldita mídia de fofocas nos últimos anos, qualquer um que faça perguntas babacas se acha repórter!

  7. Ainda bem que vc estava dodoi no seu dia de folga. Fique outras vezes doente para escrever otimos txt com esse. Meus parabens viu!
    E a ilha de Lost existe sim, viu! Eu jah fui la!

  8. @ Eduardo e Luiza

    O buraco é bem mais embaixo, gente. Esses exemplos foram apenas situações genéricas que eu já vivenciei. Tem coisa muito pior, mas aí eu citaria nomes – inclusive de brasileiros – e arrumaria mais ainda para a minha já conturbada vida. Tudo isso é muito triste e, cada vez mais, me lembro do motivo que já me afastou do jornalismo uma vez. Especialmente no Brasil, existem muitos “bullies” disfarçados de intelectuais ou “pseudo-celebridades” e eles causam um estrago tremendo. Além de estragar o trabalho dos outros – com perguntas inúteis e insistir no assunto -, muitos deles ainda sao capazes de deixar mesas inteiras desconcentradas e desconcertadas durante as entrevistas, tamanha a falta de noção. Vários colegas aqui relatam experiencias parecidas, ou seja, é um fato, não apenas uma impressão minha.

    abs a todos,

  9. Pingback: Links de Fim de Semana [29/03/08] | JUDÃO

  10. Muito bom texto !!!!
    Algumas perguntas nas entrevistas que aparecem no Fantástico me dão vergonha de ser brasileiro.

    [OFF TOPIC]
    Veja se o Borbs consegue por uma margem no lado esquerdo do texto. Fica meio estranho o texto grudado na borda da janela.

  11. O que muito desses reportes não entendem – mas adoram reclamar – é que os artistas ficam na defensiva quanto as perguntas devido ao grande numero de animais que já tiveram que dar uma resposta.
    Acho que brasileiro é melhor devido a falta de oportunidades e ao fato de ser no geral um bom jornalista mesmo.

  12. Pingback: As coletivas « Pérolas das AIs

  13. no mundo da tecnologia, não muda muito não em relação aos latinos. já fui a muitos junkets e o povo basicamente se resume a aparecer na coletiva, não fazer perguntas e sair pras compras no primeiro shopping que aparecer. já ouvi uma vez em Las Vegas ‘nossa, esses brasileiros trabalham muito, não’.
    infelizmente, no Brasil a coisa também não está melhor. Já tem pseudo-repórter que ao inventar uma pergunta de improviso, aproveita para parabenizar a empresa por sua existência no mundo. deprimente…

  14. Joyce Batista Calixto

    Hello!
    my name is Joyce Batista Calixto …

    Well, I love Hannah Montana, passion, it is very successful here in brazil, What was I wanted to spend one day with her, get autographs, take pictures, etc. … I like that I’m writing came into the hands of Miley Cyrus.Tenho 12 years …

    I LOVEEEEE
    Hannah Montana.

    Brazil July 18, 2008 (MARATAÍZES).

    ESPERO CONFIRMATION!

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