True Blood continua extremamente atual, mesmo com lobisomens e novas criaturas surgindo. É fruto de um grande conflito que ecôa no racismo e no choque de classes sociais. Lafayette e Jessica aproveitando para usar esse contexto e roubar a cena na série de Alan Ball.
Por conta de seu conceito básico, True Blood sempre apostou muito mais na política que no fantástico. E como a essência da política são as relações humanas [enquanto o fantástico envolve imaginário e, literalmente, o sobre-humano], a série de Alan Ball soube aproveitar muito bem os principais elementos dos livros de Charlaine Harris em seu desenvolvimento. Há erros, claro, afinal, há humanos envolvidos… novamente. Mas eles se perdem entre tantas escolhas corajosas e interessantes, especialmente quando pensamos em dois personagens secundários que roubam a cena constantemente: Jessica e Lafayette.
Sem a necessidade de bancar os bonzinhos o tempo todo como a paladinica Sookie ou encarar algum estereótipo, essa dupla vivida por Deborah Ann Woll e Nelsan Ellis subverte muitos conceitos sociais e fantásticos desde que suas vidas mudam totalmente com a chegada dos vampiros. Muitas séries em exibição atualmente colocam muita força em personagens homossexuais, mas aparentam fazer por obrigação ou o senso do politicamente correto do que pela necessidade do personagem em si. Foi assim em FlashForward, é assim em Stargate Universe, e tantas outras. Contra todas as expectativas, Lafayette é um balaio de gato de estereótipos, pré-conceitos raciais, sociais e econômicos e não deixa de ser interessante em um momento sequer. “Cresci numa casa cheia de mulheres e era o único homem, então a coisa mais fácil do mundo é imitar os surtos e trejeitos da minha mãe, irmãs e tias”, conta Nelsan Ellis, em entrevista exclusiva ao SOS Hollywood. “Já viu um bando de negras malucas brigando por qualquer coisa? Você se acostuma e sabe exatamente como elas reagem! (risos)”.
Treinado pela prestigiosa Jiulliard de Nova Iorque (aliás, Morena Baccarin, de V também estudou lá), Nelsan foi colega de classe de Rutina Wesley, que interpreta Tara. Mais um ponto de apoio para Lafayette, que já conhecia sua “prima” e sabia como explorar o estilo da companheira de cena. “Ele foge dos padrões e sempre surpreende, não por querer se exibir ou reafirmar, mas sim por ser um retrato das pessoas de hoje”, analisa Nelsan. “Não pelo necessariamente por ser gay, mas por ter que se virar no meio de uma crise, por ter que ultrapassar limites para manter seu estilo de vida e, acima de tudo, por se valer do direito de ser quem quiser. Tudo bem que isso muda quando os vampiros aparecem, mas isso é outra história”.
Nem tanto, afinal, os vampiros trazem uma nova ordem e sua influência abala uma sociedade já cheia de problemas. “Muita gente acha que há comparação com escravos, por conta do ‘vício em V’ [o sangue dos vampiros] e da postura de Lafayette”, comenta o ator. “É possível pensar nisso, mas agora estamos mesmo falando de uma raça totalmente diferente. Só não podemos traçar paralelos diretos, pois o vampiro gera um novo tipo de escravidão: a da alma e exerce isso pelo desejo, não necessariamente pela força”. A maioria das pessoas quer viver aquela vida, deseja se tornar um vampiro, é atraído pela sedução e misticismo daqueles seres. Mistério sempre atrai as massas, é no inexplicável que muitas pessoas encontram consolo, especialmente quando todo o resto falha. O mesmo vale para a mãe de Tara, que se perde num evangelismo cego e inabalável. Pensando assim, Lafayette acaba ficando no meio termo.
Coisa que não acontece com Jessica, personagem modificadora dos rumos da série principalmente pelo brilho de Deborah Ann Woll. “Ela é a melhor personagem da série e uma das atrizes mais relevantes desse elenco, mas pouca gente dá atenção”, defende Anna Paquin, em entrevista ao SOS Hollywood. “Quando ela entra em cena eu fico babando às vezes. E não sou de puxar o saco. Acima de tudo ela é bonita demais, as pessoas deveriam prestar mais atenção”. Eu presto e não poderia defender melhor, pois aquela brutal transição de mocinha reprimida pelo pai a vampiresa descontrolada e cheia de tesão chacoalhou as estruturas de True Blood. Como conter todo esse ímpeto? Não há resposta, há apenas a adequação a uma nova realidade.
Jessica testa seus limites e os do público, mas consegue algo além de Lafayette: a identificação total com o sonho. Foi vampirizada. Ganhou a imortalidade. E agora? Longe dos arquétipos dos lordes vampíricos ou dos seres transformados séculos atrás, Jessica não só tem que definir sua nova persona assim como precisa descobrir um mundo ao qual não tinha acesso. Mais que um renascimento, Jessica passa pela total invenção. E tudo isso é demais para qualquer um. O mundo moderno é agressivo, inconstante e cheio de possibilidades. Quando a esmola é demais, o santo desconfia, mas quando tem vampiro na parada, o exagero é bom demais para se resistir.
A condição humana prevê essa luta de poder, de influências, de desejos. Somos assim. Mas temos medo de assumir, e o entretenimento atual tem ajudado a esconder tais sentimentos. Há bastiões de porrada social, claro, mas são poucos. A relevância de True Blood nesse sentido existe por estar fazendo tudo isso com o assunto do momento: os vampiros. A chegada dos lobisomens na nova temporada aumentou ainda mais as chances de que esse conteúdo chegue especialmente ao público banalizado pelos romances disfarçados pela roupagem fantástica. Não é garantido, mas se há uma chance.
Cara, eu comentei dia desses que acho Lafayette um dos melhores personagens de TB, acho ele foda. E Jessica, preciso nem falar.
as atuações estão impecáveis,e as histórias mto bem contadas e exploradas,não é a toa que a série está alcançando tamanho sucesso,merece! adorei o texto! 😉
Pingback: SOS Hollywood
Pingback: Guto Guimarães
ADORO os dois personagens, em especial a Jessica!
E sempre fui fã do Lafayette e odiei a Jessica em um primeiro instante mas o carisma e a interpretação fabulosa da atriz me conquistaram rapidinho. Hoje, a considero uma das melhores personagens da série.
Excelente texto, parabéns!